Estudei com Bruno Cara de Vassoura. Gente da melhor qualidade. Tricolor coral Santacruzense das bandas do Arruda.
Em se tratando de futebol, para ele todo diretor é ladrão, todo jogador é cachaceiro e todo técnico é burro. Mulher de rubro-negro só fode com tricolor e o náutico é um time de moças.
Bom de bola, era titular absoluto no time do colégio. Jogava no ataque. Exímio cabeceador e chutava bem pra caramba com a canhota.
Numa partida pelos jogos estudantis, lá no campo da UFRPE, fez dois golaços. Foi contra o Salesiano, Marista, sei lá! Enfim, um desses colégios de padre. A gente perdia de um a zero e ele virou o placar. O primeiro gol, uma cabeçada certeira no ângulo. O segundo, uma cipoada de fora da área, daquelas que o goleiro não ver nem o azul da bola. Neste gol, Cara de Vassoura foi expulso porque comemorou mostrando o pau pra torcida adversária. Mas conseguimos segurar o jogo e vencemos.
O bicho era meio doido, impaciente e esparrento. E presepeiro, também.
Certa vez, num amigo secreto da turma do segundo ano, ele deu de presente a uma colega nossa, uma calcinha bem escrota com o escudo do Santa Cruz.
— Isto aqui é pra você usar quando a gente for campeão! – ele disse querendo ser carinhoso.
A garota jogou a calça no chão e foi uma confusão dos infernos. A menina não gostou da brincadeira. Nem lembro o nome dela e não sei se ela torcia pelo Santa.
Mas Bruno era estudioso. Até passou no vestibular. Foi cursar Engenharia Cartográfica, depois mudou para Administração de Empresas. Eu fui para o curso de Ciências Econômicas. Quase sempre a gente matava as aulas da sexta-feira e tomava uma no Abacaxi.
Fazia tempo que eu não via Bruno Cara de Vassoura. A última vez, se não me falha a memória, foi na saída do jogo contra o Betim, no ano passado. Falei rápido com ele.
E não é que ontem, eu encontrei aquele sujeito!
Era perto das quatro da tarde. Fui resolver uma bronca em um cartório na Siqueira Campos e por obra do destino, dou de cara com Cara de Vassoura. A mesma barba, o mesmo bigode, meio careca e mais gordo.
O mesmo esparro de sempre.
— EI TRICOLOR! Tás perdido? – ele falou chamando a atenção de todo o cartório.
Me deu um abraço.
— Diz aí, Cara! Tás bem? Novidade boa. Tens feito o que da vida? – eu perguntei.
Cara de Vassoura se separou, tem mais ou menos três meses. Depois de quase dez anos de casado. Enquanto organiza as coisas, está morando na casa da mãe.
— Tou na casa de mamãe. O perigo sou eu me acomodar e ficar por lá. – ele sorriu.
E fomos por ali, pelos arredores do Diário de Pernambuco. A Praça do Diário, a Igreja de Santo Antônio, a Dantas Barreto, a 1º de Março, a Duque de Caxias, as putas, os crentes. Caminhamos até o Pátio de São Pedro, sentamos numa mesa e pedimos uma cerveja. Era perto das seis horas da noite.
— Meu velho, e o nosso Santa Cruz? Eu não imaginava nunca que o time iria decepcionar desse jeito. – eu disse.
— Fale não. Mas tu não sabe, fui bater em Caruaru, na decisão da Copa do Nordeste -tomou um gole e continuou – tou com uma figura por lá. Vinte e sete anos, separada também. Implorou para eu ir ver o jogo por lá. Meu amigo, a tal da boceta é um negócio que vicia. Eu nem sabia que ela gostava de futebol e muito menos que era rubro-negra. Só sei que passamos a noite fazendo amor. Mas depois da final do estadual eu dispensei. O negócio tava ficando complicado. A figura tava querendo exclusividade.
Lembramos de uma vez que ele, numa calourada da Universidade, só pra se agarrar com uma boyzinha do curso de Odontologia, jurou que torcia pela barbie.
Bruno Cara de Vassoura é um sujeito sacana.
Conversamos outras amenidades. Pedimos a saideira.
Ele tomou o rumo da estação do metrô. Eu me mandei para o lado da Avenida Guararapes.
Nunca mais eu havia andado pelo centro da cidade.