Ela veio com a determinação dos craques. Parecia um artilheiro que sabe a hora exata de dar o drible e fazer o gol.
— Papai, preciso falar um negócio contigo!
— Diga, minha filha.
— Tu sabe que meu aniversário tá chegando, né? Então eu queria que você realizasse um sonho meu.
Com essa ginga, ela já deixou o experiente zagueiro meio bambo.
Olhou nos olhos dele e continuou a jogada sem deixá-lo esboçar alguma reação.
— Sabe qual é meu sonho? Eu queria comemorar meu aniversário de nove anos no Santa Cruz. Queria que tu conseguisse que eu e meus amigos jogasse bola no campo.
Com essa, ela desmanchou o zagueirão e ficou de frente pro gol.
Finalizou o lance com um lindo arremate.
— Sabe o que é, papai? É que na minha sala só eu torço pelo Santa Cruz. E aí, eu queria levar meus amigos para conhecer lá. Queria que eles vissem o Santa de perto.
A garota meteu a bola no ângulo. Fez um golaço. Um gol de anjo.
Abri um sorriso e lhe dei um abraço.
— Vou tentar, filha!
Ela me beijou. Os dois olhinhos eram brilho puro.
Saiu para concluir a tarefa de casa e eu fiquei como uma criança que ganha o melhor presente do mundo.
Passei alguns dias pensando e projetando como seria a festa. Troquei umas ideias com a mãe e começamos a desenhar o aniversário. Levaríamos a criançada para conhecer as dependências do clube e ao final faríamos uma pelada de futebol.
A primeira providência foi olhar a tabela pra ver se iria haver jogo. Tivemos sorte. O Santa Cruz jogaria na quarta-feira no Arruda contra o Juazeirense e depois no domingo, contra o Central, em Caruaru.
Como eu sabia que não seria possível jogar no gramado do Arruda, liguei para o campinho society. Pra minha felicidade, tinha horário disponível no sábado pela manhã.
Procurei saber com quem deveria falar no clube sobre o assunto. Me indicaram conversar com o pessoal do marketing. Fui, batemos um papo e o “projeto” ficou pronto. A meninada iria fazer um passeio pelo clube, começando na Sala de Troféus, depois visitaria o estádio, os vestiários e se possível o gramado.
Quando eu disse a ela como a gente estava pensando em fazer e perguntei se tava bom, a menina se desmanchou em lágrimas misturadas com sorriso.
Impomos apenas uma condição: não seria permitido a entrada de ninguém que estivesse vestido com camisa de outro time, a não ser a do Santa Cruz. A única exceção seria para camisa de clubes do exterior ou de alguma Seleção.
Sábado passado, fizemos a festa.
Amigos, primos e colegas da escola. Quase 40 crianças percorreram os caminhos da nossa sede e do nosso estádio. Foram as tribunas de honra, cabine de imprensa, vestiário. Conseguiram tirar fotos com alguns atletas. Ficaram alucinados.
Um deles chegou e disse baixinho:
— Tio, eu sou do Sport. Mas estou adorando isto aqui.
Uma das amiguinhas me perguntou se eu podia levá-la para assistir a um jogo no Arruda. Outra, ao chegar em casa, disse ao pai que ele deveria mudar de time e ser do Santa Cruz.
E a aniversariante, quando terminou os parabéns, me abraçou e disse:
— Papai, eu te amo! Esse foi o melhor aniversário da minha vida.