Amor na veia.

Eu tinha 5 anos de idade quando meu pai me levou, pela primeira vez, ao Arruda. Uma das lembranças mais fortes de minha infância, no Mundão, foi um drible fantástico que o lateral Pedrinho deu em cima de um atacante do Remo dentro da pequena área. O estádio foi ao delírio.

E como não se lembrar da Churrascaria Colosso e aquele cheiro único de carne assada que exalava para todo lado e domava nossa mente com um poder absoluto? Eu comecei a beber com 12 anos e ir ao Colosso, a partir de então, se tornou quase um ritual religioso. Assim como gritar pelo cara que vendia a Brahma Chopp, aquelas garrafas gordinhas, e que despejava de uma vez o líquido precioso no copo de plástico.

Um jogo memorável, que fui com meu pai, foi a inauguração da arquibancada superior. Era uma multidão absurda se espremendo com um orgulho danado pelo novo espaço. Até parecia que o concreto balançava e a galera, com medo,  começou a gritar “Vai cair! Vai cair!” e era gente correndo para tudo que era lado.

Meu pai, meus irmãos e eu fomos ver o clássico contra o Palmeiras. Quem esteve nesse jogo deve ter se sentido como se estivesse no meio do Galo da Madrugada na Guararapes. Era um espremido só. Vimos o jogo lá de cima. Era impressionante a quantidade de tricolores corais das bandas do Arruda se contorcendo para tentar acompanhar a partida.

Já escrevi aqui quando estava entrando no Arruda e a Jovem veio correndo para me dar porrada porque eu tinha cabelo comprido e queriam, mesmo, era matar Mancuso. Foi o momento mais tenso que tive em um jogo. Gritavam “Olha o fdp do Mancuso ali, bora pegar ele!” e tome carreira. Por sorte, consegui correr mais do que o Usain Bolt e sai ileso.

Quando o Santinha tirou o cabaço do Do Recife, a coisa, nesse jogo, a Inferno invadiu o campo. Era um delírio coletivo gigantesco. Vi algumas pessoas pulando para dentro de campo, saltando sobre o fosso, e uns espertinhos roubando relógio e trancelim da galera que quase se fode caindo fosso abaixo. Loucura arretada.

E o que falar daquela multidão ensandecida que se espremeu como loucos para ver o jogo de acesso contra o Betim? Dizem que tinha umas 60 mil pessoas. Nem com a porra tinha menos de 80 mil pessoas ali. A entrada foi esquizofrenia pura. Um maluco tentou cortar a multidão em seu carro para entrar no estádio. Um senhor foi quase esmagado pelo veículo e deu um soco no capô do carro. Um policial chegou batendo no senhor que, assim que levou o primeiro empurrão, sacou da carteira, empunhando sua identificação, e berrou “Sou capitão da PM. Você está preso”. E não é que prenderam o policial na hora?!

O gol de Caça-Rato no final do segundo tempo levou a torcida a um delírio inacreditável. A charanga da Inferno cadenciava o êxtase coletivo. Parecia um ritual de povos primitivos em sintonia com as deusas mais poderosas.

O meu pai me ensinou 3 grandes amores: amor à vida, amor aos amigos e amor ao Santinha. De minha mãe herdei o amor à Literatura, à Filosofia e ao ato de escrever. Tudo isso me formou e me forma, dá sentido à minha existência.

Morar perto do Pátio da Santa Cruz é algo que me enche de um orgulho metafísico. Foi aqui que nasceu o Santa Cruz, esse clube do povo. Impressionante como o Mais Querido ocupa um lugar de tanta relevância e importância em minha vida. Muitas lembranças revestidas de muito amor e de uma paixão gigantesca que não precisa de explicação, apenas é em si mesma.

Ansioso pelo retorno de nosso passado de glórias. Haja paciência diante de tanta incompetência e más intenções. Mas sou um otimista nato e não tenho dúvidas: essa imensa torcida será nossa ponte de salvação. Lembrar é um ato de redenção, de amor por aquilo que vale a pena. Lembrar para nunca esquecermos quem realmente somos.

Sou Santa Cruz de corpo e alma e serei sempre de coração!

4 respostas para “Amor na veia.”

  1. Quando lembramos de tudo que passamos aí vc tem raiva, quando se ler um texto desse… se lasque a raiva porque eu tô com o povão! Povão esse que dar combustível pra manter o nosso amado santa cruz vivo! Costumo dizer que o maior orgulho em dias de hoje em ser torcedor do santa cruz ,é ver o amor da própria torcida! Chega logooo 2022 porque o povão que voltar pra casa.

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