Feliz 2017 para nós

2016 já era. Foi embora sem deixar muitas saudades. Bem que podia ter acabado no primeiro semestre.

Ganhamos o estadual e a inédita Copa do Nordeste, mas terminamos na pindaíba de sempre. Dívidas, cesta básica, essas coisas que nunca saem do Santa Cruz.

Chegou 2017. Quem venha cheio de felicidades nas cores preta-branca-vermelha.

Desejamos:

– mais uma taça do campeonato Pernambucano;

– o bicampeonato do Nordeste;

– o acesso a Série A;

– o título da Copa do Brasil;

– ganhar a Sulamericana;

– acertos na maioria das contratações;

– que peladeiros do nível de Allan Vieira, Márcio Araújo, Pisano e outras desgraças, não venham para o Santa Cruz;

– aumento no quadro de sócios;

– o Arruda limpo e cheiroso;

– o salário dos funcionários em dia;

– o salário dos jogadores em dia;

– a torcida lotando o Arruda e sendo bem tratada na entrada do estádio;

– o gramado sem buracos;

– uma porra de um centro de treinamento;

– transparência nas contas;

– prestação de contas da Comissão Patrimonial;

– não vermos cambistas vendendo ingressos de sócios;

– um placar no estádio;

– etc.

Sim, e também,  muita saúde e dinheiro no bolso.

 

Confraternização

Desta vez, ao invés de marcarem num boteco, a confraternização foi no apartamento de Assis.

No ano passado, fizeram em um bar. Deram o azar de encontrarem uma confraternização de uns almofadinhas alvirrubros. Na mesa deles, havia uns oito ou nove barbianos. O mais escuro tinha a pele branco gelo e o cabelo repartido de lado.

Celso, já com o carburador meio encharcado e sem controle do volume do som, disse: “setenta por cento da torcida do timbu tá naquela mesa”.

Um dos brancos rebateu: “tricolor só tem dinheiro pra tomar skol”.

Celso quis pegar ar, mas a turma segurou a onda.

“Tu vai dar atenção a esses atabacados, é? Deixa pra lá…”. – Ivan falou.

Por uns instantes, o clima acalmou. Mas à proporção que o consumo de combustível ía aumentando, qualquer gargalhada soava como provocação, qualquer “tomar no cu” era falta de respeito do adversário.

A bronca foi quando Celso, voltando do banheiro, resolveu entrar no campo deles. Foi até a mesa adversária e desejou um feliz ano novo. “Galera, na boa, eu queria desejar um ano novo cheio de paz, saúde e felicidades pra vocês…”.

“Claro, rapaz! Tudo de bom, pra vocês também! Somos da paz”, retribuiu um galego.

Celsinho completou: “… e que vocês continuem sem título e comemorando o hexa!”.

A confusão foi grande. Não fossem os seguranças do estabelecimento, tinha havido uma guerra.

Depois desse fato, ficou decidido que a confraternização de 2016 seria na casa de alguém. No sorteio, saiu o apartamento de Assis. Assis Mosca Morta.

Compraram um barril de chope e mandaram fazer uma feijoada. Cada um levou um brebote. Amendoim, castanha, salgadinhos, essas coisas.

Vez por outra, a turma fazia o seguinte ritual: uma rodada de caldinho e uma lapada de aguardente.

Josué já ía no décimo ou nono copo de chope, com a voz meio embolada ele: “se num amigo secreto, por exemplo, eu tirasse Allan Vieira, eu dava uma flanela a ele, pra ele deixar de jogar bola e ir tomar conta de carro”.

Tacinho perguntou: “e se tu tirasse Márcio Araújo?”

“Eu dava uma enxada a ele”.

A risadagem foi grande.

Na retrospectiva do ano, algumas recordações. Nomes como Mazinho, Chimbinha, Vágner, além de Allan Vieira e Mário Sérgio, foram escolhidos por unanimidade para serem titulares do time de perronhas de 2016. Para treinador, houve empate técnico entre Milton Meme e Deriva.

Quem soltou a maior perua foi Naldinho. “Tudo indica que vamos contratar Luis Fabiano”. Quase leva um babau.

Lembraram a viagem para Campina Grande. “Eu não esqueço daquela gostosinha chorando de alegria. Nunca mais vi aquele filé em jogo do Santa. Sou doido pra encontrar ela de novo”.

Até hoje, Josué se lembra daquela garota no jogo da decisão da Copa do Nordeste.

Ele só não recorda mesmo, como foi que chegou em casa depois da confraternização. O limite da lembrança é a hora em que fizeram um brinde e alguém disse que o chope havia acabado. Sabe que a bebedeira continuou, mas não sabe como terminou.

Josué acordou com marteladas na cabeça. Teimou em não abrir os olhos. “Puta que pariu, que ressaca do caralho!”.

Virou de lado e pegou no sono de novo. Sonhou com o Santa Cruz campeão em 2017.

Apostaço na Timemania

Amigos tricolores corais santacruzenses das bandas do Arruda, faz tempo que não apareço neste Blog. Depois que voltamos aos velhos tempos das cestas básicas, salários atrasados, essas coisas, pedi licença para tratamento de interesses particulares e dei um tempo.

Mas estou por aqui. Revigorado e renovando a esperança. Torcendo que tudo volte ao normal e que 2016 acabe o mais rápido possível. E que 2017 venha cheio de conquistas, felicidades e comemorações.

Daí, pra finalizar esse terrível semestre, mostrando que quem é cobra coral do gramado do Arruda não morre fácil, muito menos abaixa a cabeça, vamos entrar com a gota serena nos jogos da Timemania.

Pra quem ainda não sabe, a gente precisa manter o Santa Cruz entre os 20 melhores da Timemania, pois só assim, temos um bom percentual para abater a nossa dívida federal.

Esse Blog e a turma da Minha Cobra bolou uma ideia pra ajudar. O cabra que fizer cinco apostas, ganha um dos livros do Blog e concorre a um sorteio de duas camisas da Troça Minha Cobra – 2017 e uma camisa da lojinha do clube.

A regra é simples:

A cada cinco jogos realizados, o torcedor que apresentar as apostas na loja Cobra Coral, ganha um dos livros do Blog do Santinha e concorre a duas camisa da Troça Minha Cobra, uma camisa oficial de jogo e uma camisa casula da loja Cobra Coral.

Então, meu nobre! É correr pra loteria, ajudar o Santa Cruz a se manter entre os 20 primeiros e ir na loja Cobra Coral pra ganhar brinde.

Conversa

Despretensiosa, a conversa rolava solta. Adalberto nos contou uma história que na família dele, um primo namorou quase dez anos com uma moça. Faltando menos de um mês pro casório, a noiva desistiu do enlace. Sem apresentar nenhum motivo, ela não quis mais casar.

— o desmantelo foi grande, – disse Adalberto – minha tira foi até socorrida. Lasca é que com menos de seis meses ela tava casada com outro. Um cara que apareceu do nada.

— oxi, só pode ter sido gaia! – setenciou, Luizão.

— foi não. – Adalba retrucou.

O assunto rendeu um bocado. Uns a defender o noivo, outros a defender a noiva. Levantamos várias teses sobre gaia e não chegamos à conclusão nenhuma.

— Gaia é um negócio meio cultural – falou, Farol de Milha.

— Como assim, cultural? – perguntou Tadeu.

Alicate tomou a frente de Farol de Milha e explicou.

— Doido, tem lugar por aí que o cara tem não sei quantas mulheres. Outro dia eu ouvi dizer que nos índios, num tinha essa de casar não. As índias fodia com quem quisesse. É cultural, esse negócio de gaia.

— E as cachorras, ali é que é onda. A danada fica no cio, vem um e cheira, vem outro e lambe, vem um bocado de cachorro atrás dela, sarra, se esfrega, mas a miseravi só trepa com um. Eu acho isso, arretado! Imagina se a gente fosse assim – Luizão falou e deu uma gaitada.

A prosa tomou outro rumo. O reino animal. Não sei quem da turma veio com uma história que o carrapato da capivara transmite uma doença que pode matar seres humanos. Contei que já havia comido carne de capivara.

— Ainda bem que o carrapato é no couro, não é na carne – disse, Adalba.

— É proibido comer carne de capivara! Tadeu falou.

— Tu agora é do IBAMA, é? – Luizão perguntou.

E a turma começou a debater sobre a proibição de se comer carne de capivara. Uma bancada argumentou que é proibido caçar, mas comer a carne pode. A outra defendeu que se não pode caçar, não pode comer. O impasse rendeu um bocado. Outra rodada de cerveja.

A sabedoria de Luizão falou mais alto.

— Vocês tão tudo errado! E o IBAMA vai entrar na casa dos outros pra ver quem tá comendo carne de capivara?!

Pronto. A pauta mudou pra discussão sobres os motivos que fazem o IBAMA não conseguir atuar de forma eficaz.

“Os caras só querem comer bola”

“O IBAMA é pequeno para o tamanho do Brasil”

“O governo quer lá saber de porra de IBAMA, de bicho, nem de preservação”

Aí, Adalberto soltou a frase: O Governo não que saber do povo, imagine dos bichos!

Foi o gancho para se falar de política. Corrupção, a eleição de Olinda, a tal da PEC, a insegurança, essas coisas.

— Falando em política, eu só quero saber se esse Trampe vai lascar a gente, como tão dizendo por aí? – indagou, Alicate.

— Num lascando minha cerveja e o Santa Cruz, pode lascar o resto! – disse Tadeu.

Adalberto deu um gole na cerveja. Lubrificou as cordas vocais e mandou sua opinião econômica.

— Rapaz, o pau só quebra no mais fraco. Pode ser Trampe, Obama, qualquer um. Agora, tenho pra mim que essa eleição de lá pode prejudicar um cabra feito Keno, um Grafite… Esse Trampe não gosta de negro, nem de brasileiro e nem de imigrante. Vai ficar mais complicado jogador daqui ir jogar lá.

— Então, vai ser bom pro Santa Cruz, né? – perguntou, Alicate.

— É lógico! – Luizão afirmou.

Ficamos alguns minutos em silêncio e começamos a falar de futebol.

A alegria que vem da arquibancada

Desci a Serra nas carreiras. Não queria chegar ao Arruda atrasado. Nas pressas, terminei sem combinar nada com ninguém.

Fui sozinho, pensando em ir para as cadeiras e dizendo pra mim que seria minha despedida de 2016. O último jogo. O derradeiro encontro com meu time, com minha casa, com meus milhares de amigos.

Na solidão do percurso até o Mundão , a tristeza insistiu em dominar. Mas venceu a alegria de tantos momentos bons, destes vários anos de Santa Cruz. O rolete de cana, minha bandeira, a flâmula com o timaço de 1976 que ficava pendurada na cabeceira da cama, eu e meu pai nas sociais, o gol de Célio, o ano mágico de 2005, a Sanfona Coral, as viagens e aventuras pela Série D, a cabeçada de Caça-Rato contra o Betim,  a Copa do Nordeste em Campina Grande, as infinitas amizades, as vitórias.

Dobro a esquina da rua do Canal e o mundo se torna colorido. Preto-branco-encarnado. Avisto o pessoal do Poço calibrando o fígado numa barraca da beira do canal. A turma da Kombi Coral. Naná, Peito de Pombo, Ninha, Dái e Boy. Perguntei por Oswaldo Titio e Diazepan. Um estava no interior, o outro no aniversário da filha.

Encontrar com esse povo do Poço é tomar uma injeção de otimismo e felicidade. Pra eles não tem tempo ruim.

“Gerrá, hoje só vem quem gosta mesmo!” – disse, Naná.

Conversamos um pouco e me mandei pra comprar minha entrada. Corri como se não houvesse mais ingressos.

Na calçada, perto da bilheteria, encontro Samarone e Zeca.

“Cadê tu, porra?” – Sama perguntou.

“Gerrá, caralho! A gente existe, porra!” – gritou Zeca, o filósofo!

O sorriso estampado no rosto dos doidos, me levou para arquibancada.

Encontramos com Naná e cia. Ficamos juntos. Bem acima do escudo, na linha do meio campo.

No gol de Léo Moura, uma explosão de felicidade. Parecia que o campeonato estava começando. Foi como se a gente estivesse gritando para o mundo que estamos vivinhos da silva. No apito final, abraços, sorrisos e esperança.

Fazia tempo que eu não sentia a vibração e o calor do cimento da arquibancada. Os bons ventos daquele lugar me fizeram esquecer que somos quase lanterna, que a seribê de 2017 nos espera e que nossa campanha foi uma vergonha. A alegria de hoje me avisou que ainda temos duas partidas no Arruda e que a Terra gira.

No próximo jogo, quero estar lá.

Santa Cruz na cabeça

Dos poucos grupos de zap-zap que participo, alguns são do Santa Cruz. Na verdade, quatro grupos são formados por tricolores corais santacruzenses das bandas do Arruda. Cada um com suas peculiaridades e suas doidices.

Um grupo com 19 pessoas. Outro tem 12. Tem um com 13 participantes.  E, um deles, com 168 corais. Isso mesmo, cento e sessenta e oito apaixonados pelo Santa Cruz Futebol Clube.

No grupo dos dezesseis, reina a bipolaridade. Se o time estiver bem, o mundo é uma maravilha, o Brasil se livrou da corrupção e o Recife é uma cidade extremamente segura. Se nosso esquadrão perde, a vida vira uma desgraça. Nada presta. Tudo está perdido. Nesse grupo, eu me divirto com a ira de alguns malucos.

Na turma que tem treze tricolores, a amizade é antiga. O Santa Cruz nos uniu. Nesse grupo, tem uns que pensam que entendem de futebol, outros tem plena consciência que não entendem porra nenhuma e uns dois ou três, são daqueles chatos que só sabem criticar.

O dos doze é uma onda! Amigos de futebol, forró e carnaval. Alguns são ateus. Ninguém frequenta igreja. Todos são profissionais na bebida. Nesse grupo, tem hora que se fala mais de política do que de futebol. A cachaça e a farra estão acima de vitórias, empates e derrotas. Ninguém leva o Santa Cruz muito a sério. Nesse grupo Thiago Cardoso não é unanimidade, Luan Perez é chamado de zagueiro de condomínio, Milton Mendes é tratado como louco e Doriva faz parte da lista dos piores treinadores que já apareceram por aqui.

Já o grupão, o que tem 168 apaixonados pelo Mais Querido, esse merece um estudo. Primeiro que só é permitido assuntos que tratem do Santa Cruz. Quem manda piadas, vídeos, aquelas mensagens tabacudas de bom dia e outras donzelices, é esculhambado e sumariamente excluído. Engraçado são os pedidos para que incluam a pessoa de volta. Mas o melhor desse grupo é que não existe os chatos de plantão, os que só criticam e sentem orgasmo ao reclamar. Quando aparece um desse, naturalmente é engolido pelo positivismo.

Lá, o lema é acreditar sempre. Na derrota ou na vitória, é Santa Cruz na cabeça.

Frases do tipo: “Torcer qualquer um torce. Fazer parte de uma história de superação e travar uma guerra a cada campeonato, é para poucos!”

Ou: “Vamos firme e forte fazer o que fazemos de melhor : apoiar nosso time! Sempre!”

São comuns no grupo dos cento e sessenta e oito.

Essa semana, mandaram uma foto bem legal. Era de uma bandeira com o escudo do Santa e o seguinte texto:  meu amor por ti nunca será rebaixado.

Sou fã da turma do grupão. Pra mim o Santa Cruz é igual àquela bebida preferida. Vez por outra dá ressaca danada. Mas basta passar a dor de cabeça, que a gente já tá salivando pra tomar outra. Triiiiii!

No caminho da concentração

Do local de treinamento até a concentração, um hotel de médio porte, a distância não é tanta. Mais ou menos, uns 15 quilômetros.

O trânsito é intenso. O ônibus segue lento e a viagem é meio enfadonha.

No banco de trás, com um fone de ouvido verde-escuro, o lateral-esquerdo ouve um rap e balança a cabeça. Na cadeira ao lado, o atacante curte umas postagens no facebook. E, um pouco a frente, o zagueiro tenta dar um cochilo.

O lateral direito olha a paisagem pela janela. Era uma galeguinha desfilando pela calçada. Ela vinha da academia. Ou ía. Vestia aquelas roupas coladinhas no corpo.

O lateral, depois de mais de um mês entregue ao DM, finalmente volta a concentrar.

— Será que tu vai pelo menos pro banco? – perguntou o atacante reseva.

— Sei lá! – respondeu o ala – quem deve saber é o professor Pardal!

Professor Pardal está no cantinho dele. O terceiro assento do lado direito. Do lado dele, o auxiliar técnico.

Ele tem um ritual. Sempre senta no mesmo lugar, sempre está com um livro na mão. Na maioria das vezes é de auto-ajuda ou algo referente ao futebol. Alguns atletas tiram sua onda e dizem que o professor finge que gosta de livro, mas o que ele aprecia mesmo é revista de pornografia. Revista de mulher nua.

— Punheteiro safado! – um deles diz.

Todos caem na gargalhada.

Pardal está sério. Parece estar bem compenetrado. Lê um livro de psicologia esportiva. “A construção do tipo “Jogador de Futebol” sob o olhar da psicologia social do esporte”.

O engarrafamento é de encher o saco. O segundo goleiro faz um batuque e tenta puxar um pagode. Ninguém acompanha.

Do nada, o professor se vira para seu auxiliar técnico e diz:

— Vou te fazer uma pergunta?

O auxiliar balança a cabeça feito uma lagartixa e espera a questão.

Pardal manda:

— Você seria capaz de amar uma mulher fora do seu casamento?

— Como assim? – indaga o auxiliar.

— Não entendeu? Tou perguntando se você seria capaz da amar uma mulher fora do seu casamento.

Uns segundos de silêncio e o auxiliar levanta diz:

— Mestre, ninguém é dono de ninguém. E essa coisa de amar é muito subjetiva. Objetivamente o que é amar? O que é amor? O que é paixão?

O treinador foi ficando com um semblante esquisito.

O auxiliar continuou:

— Sabe, eu até hoje não sei se gosto de mulher. O que tenho certeza é que gosto mesmo é de buceta, de peito, de beijo na boca. E tenho muito amor no meu sangue. Daí, vez por outra preciso fazer uma doação.

O auxiliar do técnico terminou sua explanação com uma gargalhada. Não percebeu que Pardal estava com o olhar fixo perdido pela janela. Professor Pardal começou a chorar.

— Mestre o que foi?

— Nada, nada – ele respondeu choromingando.

Alguns jogadores viram e a notícia logo se espalhou. A noite a greia entre os atletas foi grande.

O atacante perguntou pro zagueiro:

— Tu visse o professor chorando?

— Vi. O que terá sido?

— Sei lá. Aquilo é um doido.

O zagueiro arrematou:

— Só pode ser gaia…

O visionário que entende de futebol

A gente havia feito uma partida ridícula contra o América. O jogo foi na Casa dos Festejos e apenas empatamos. 0 a 0.

Dos mil e poucos torcedores que foram, uns voltaram para casa revoltados, outros descrentes. Todos, arretados da vida.

Cláudio, amigo meu que trabalha na Celpe, foi duro: vou te dizer uma coisa! Se for pra série A com esse time aí, a gente vai fazer vergonha!

Naquela ocasião, eu achei um tanto exagerado o comentário dele. Afinal, ainda era o mês de março. Faltava quase dois meses para, depois de 10 anos, a gente jogar de novo na primeira divisão do brasileiro.

Nesse intervalo, fomos campeões da Copa do Nordeste e Bi do Pernambucano. Festa do povão!

Cláudio foi para Campina Grande e viu de perto o Santa levantar a taça.

Uma semana depois, outra festa. Tomou todas comemorando o título do pernambucano.

Logo em seguida, mandou um zap para mim: “isso não é time para uma série A. E esse treinador tem prazo de validade”.

Não respondi. Apenas pensei: que bicho chato do caralho!

Estreamos no brasileiro. Às 11 horas da manhã, num Arruda pegando fogo, metemos 4 a 1 no Vitória.

Na sequencia, fomos jogar contra o Fluminense. Lá no Rio, arrancamos um empate de 2 a 2. Naquele jogo, nosso time acabou a partida com seis atacantes em campo. Na ilusão, um bocado de gente (inclusive eu), achou que definitivamente o Santa Cruz havia se tornado um time moderno. Exceto, Cláudio.

Voltamos para Recife. Santa Cruz x Cruzeiro. Quatro a um de novo. Grafite fez um golaço. O Tricolor do Arruda, o Clube Mais Querido, virou a sensação do campeonato, ao ponto de um comentarista da Sportv dizer que nosso time era o mais arrumado do Brasil. Fiz questão de enviar o link pra Cláudio.

Como se estivesse escrevendo um telegrama, ele respondeu: estamos bem. Ainda é cedo. Campeonato é longo. Reunião.

No sábado seguinte, encontro com ele. Marcamos pra tomar umas e ver o jogo contra a Chapecoense. Empate fora de casa. Se o campeonato acabasse ali, o Santa Cruz tava na libertadores.

Pedi uma rodada de chopp, mas o porra do Cláudio, mais frio do que um presunto no fundo do congelador, saiu com essa: “Gerrá, esse time tá enganando. O grupo é limitado. Se tirar os bons que estão no time titular, não tem quem entre. E esse treinador, além de doido, gosta de fazer ciência na equipe e expor jogador ao ridículo. Logo, logo, ele perde o grupo. Sei não….”.

“Meu irmão, tu parece aqueles caras que tá no meio de um churrasco e vem avisar que carne vermelha não faz bem pra saúde. Vai te fuder. Bora comemorar, porra!”, eu disse.

Gargalhamos e fizemos um brinde.

Naturalmente, me afastei da chatice dele. Evitei mensagens e não marquei mais para ver jogos.

Passaram-se rodadas, os outros times foram melhorando, o Santa Cruz começou a descer a ladeira em direção a seribê, trocamos de treinador, contratamos uns perronhas e a profecia de Cláudio foi se consumando.

No jogo contra o Palmeiras, encontrei com Cláudio. Antes que ele falasse qualquer coisa, eu me antecipei: “eu não sei se tu és um visionário ou se tu entende mesmo de futebol. Ou as duas coisas juntas. Puta-que-pariu, tu tava certo!”.

Ele começou a rir.

Assistimos ao jogo juntos. Bebendo Itaipava e conversando ameninades.

 

Hoje, eu vou é pro Arruda.

Ivonaldo, o cara da xerox, vem me dizendo o tempo todo: “dotô, é outra competição. É outro jogo. Vá por mim!”

Eu não sei de onde Ivonaldo tirou a ideia que eu sou doutor. Nunca fiz doutorado, não sou médico e nem advogado.

De segunda-feira pra cá, o negro Ivonaldo tem dado uma injeção de otimismo nos tricolores corais santacruzenses da repartição.  

Mesmo depois de tanta lapada na seriá, o negro Ivonaldo tem suas razões para acreditar tanto.

— Dotô, quando a gente menos espera, a cobra levanta e dá o bote.

Balancei a cabeça concordando.

— Série A é uma coisa. Essa Sulamericana é outra!

Concordei também.

— Dotô, é como se o cabra tivesse duas mulher. Se ele broxa com uma, não quer dizer que ele vai farrapar com a outra. Pelo contrário, aí é que o camarada quer mostrar serviço.

Dei uma gargalhada e concordei mais uma vez.

— E sabe de uma coisa? Hoje quem não tiver pensamento positivo e não quiser apoiar os noventa minutos, é melhor ficar em casa vendo pela televisão ou escutando pelo rádio. Quero lá saber de jogador, treinador, diretor, essas porras. Eu sou é Santa Cruz.

Apertei a mão de Ivonaldo e dei uma ajuda para ele comprar o ingresso. Hoje, eu vou é pro Arruda.

Rafael, 5 anos de amor e paixão pelo Santa Cruz

Quando a gente perde de maneira vergonhosa, me bate um misto de raiva, tristeza, baixo astral e irritação.

Ontem foi de um jeito que até me esqueci da temática do aniversário de Rafa. A fihca só caiu, quando vi a primeira dama e minhas filhotas devidamente uniformizadas. “Oxente, é pra ir com a camisa do Santa Cruz?”

Nem precisou de resposta, vesti minha camisa e nos mandamos pra festa.

Seguimos para um campinho society em Campo Grande.

No banco de trás, as meninas riam da minha briga com o GPS.

“A 200 metros, vire à direita”.

“Virar à direita? Viro nada. Eu vou é em frente”.

No percurso, o Estádio do Arruda embeleza a paisagem.

Comentei com Alessandra sobre a mobilização que vários músicos estão fazendo para o jogo da quarta-feira pela Sulamericana. Estão montando o Orquestrão Tricolor. Já são mais de cem músicos confirmados.

“No dia que esse Santa Cruz acordar, ninguém segura ele. São poucos os clubes que tem a nossa força”, ela disse.

As meninas disseram que estavam com saudades do Arruda.

O GPS indicou para virar a esquerda e logo em seguida virar à direita. Eu segui em frente e virei à esquerda. Chegamos à festa. Até o porteiro do campo society estava vestido do Santa Cruz. Era Daniel, que também é porteiro do colégio de Rafa e das minhas meninas.

Qualquer dia, eu escrevo sobre Daniel. Sempre que a gente vence, silenciosamente ele tira a sua onda. Bota a camisa do Santa Cruz por baixo da farda e recebe todos com o mesmo sorriso de sempre e o mesmo bom dia. É impressionante a capacidade que Daniel tem de saber o nome de todos os alunos.

A mesa da festinha de Rafa tava uma beleza. O Santa Cruz em todos os lugares. O painel, as camisas que Refael tem do Santa Cruz. Desde a primeira roupinha até a de hoje.

O gramado estava quarado de pirralhos. Meninos e meninas jogando futebol, pula-pula, piscina de bolas e brincadeiras. Uma farra.

Lá pras tantas, um telão mostrando imagens de Rafael. Nos jogos, nos treinos, com  jogadores. Néris, Grafite e outros gravaram mensagens pro aniversariante.

Acho que tinha umas oitenta crianças. Um bocado do Santa Cruz, outros da turma da Abdias e dois da barbie, a prima de Rafa e um amiguinho dele.

Coisa linda o aniversário de Rafael. Futebol no seu mais belo formato. Sem preconceito de cor, sexo ou camisa.