Feliz 2017 para nós

2016 já era. Foi embora sem deixar muitas saudades. Bem que podia ter acabado no primeiro semestre.

Ganhamos o estadual e a inédita Copa do Nordeste, mas terminamos na pindaíba de sempre. Dívidas, cesta básica, essas coisas que nunca saem do Santa Cruz.

Chegou 2017. Quem venha cheio de felicidades nas cores preta-branca-vermelha.

Desejamos:

– mais uma taça do campeonato Pernambucano;

– o bicampeonato do Nordeste;

– o acesso a Série A;

– o título da Copa do Brasil;

– ganhar a Sulamericana;

– acertos na maioria das contratações;

– que peladeiros do nível de Allan Vieira, Márcio Araújo, Pisano e outras desgraças, não venham para o Santa Cruz;

– aumento no quadro de sócios;

– o Arruda limpo e cheiroso;

– o salário dos funcionários em dia;

– o salário dos jogadores em dia;

– a torcida lotando o Arruda e sendo bem tratada na entrada do estádio;

– o gramado sem buracos;

– uma porra de um centro de treinamento;

– transparência nas contas;

– prestação de contas da Comissão Patrimonial;

– não vermos cambistas vendendo ingressos de sócios;

– um placar no estádio;

– etc.

Sim, e também,  muita saúde e dinheiro no bolso.

 

Politicamente incorreto

Meus amigos tricolores, uma das coisas mais politicamente incorretas que conheço é o tal de apelido de jogador de pelada. Começa pelo próprio nome do jogo: pelada. Pode ter sido derivado do termo péla, as bolas de couro, ou do fato de não ter grama nenhuma no campo.
Seja como for, pelada é aquele lugar muito estranho onde os amigos se reúnem para bater uma bolinha e tomar umas cervas depois de suar a camisa. Há peladas de grandes amigos onde o objetivo é só se divertir mesmo. E há aquelas em que os caras se acham profissionais da bola e, vez ou outra, o pau canta. Seja por uma entrada mais dura, por alguém que faz corpo mole ou por uma falta não marcada – e quase sempre todo mundo é juiz também na pelada.
Na minha adolescência, eu jogava pelada num campinho na praia do Janga. Pense nas figuras mais esdrúxulas do mundo que compareciam àquela várzea. E quase todos carregavam os nomes mais estapafúrdios possíveis.
Lembro de um nerd de óculos e cabelos desgrenhados que ia jogar. O apelido? Taboclécio, o tabacudo. Apelido composto. Taboclécio tinha a maior cara de punheteiro donzelo. Mal emitia uma palavra e jogava mal pra caralho.
Tinha um cara que possuía uma das pernas menores. Ele andava equilibrando o corpo e gingava entre a perna maior e a menor. Batizaram o cara de Amassa barro. Outro, marombeiro e que só falava em carnaval e nas mulheres da festa, foi batizado de Pipoca.
O grupo era bem eclético: Tição, Monstro, Pereba que era um gordão desengonçado e que batia que nem um filho da puta, Epocler que era um cachaceiro inveterado, Goió, Maluqinho que era um maconheiro convertido, Gordo e Satã. Satã era feio feito o diabo, daí o apelido carinhoso.
Fiquei imaginando um narrador profissional narrando essa pelada. Seria mais ou menos assim:
“Taboclécio pega a bola, vê Tição correndo pela esquerda. Goió se aproxima para tomar a bola. Taboclécio lança pra Tição…. coooortaaaa Satã. Satã carrega a pelota, lança para a esquerda para Epocler. Epocler treme, faz que vai vomitar, toca a bola de qualquer jeito. Domina Maluquinho. Maluquinho corre pela direita, vai chegando na área. Amassa Barro chega com violência, acerta a perna de Maluquinho e é… faaaaltaaaaaa”.
Aí começa uma confusão da porra. Briga daqui, briga dalí e a falta vai ser cobrada. Volta o narrador:
“Gordo bate a falta tocando para Epocler que já se recuperou da vomitada. Epocler lança para Satã que peeerde a bola pra Monstro que chegou com tudo. Monstro dribla Goió e passa voando pelo Gordo. Monstro toca pra Tição que toca para Pereba que vê Taboclécio na esquerda e Monstro na direita. Pereba lança para Taboclécio, Maluqinho e Satã se aproximam para tomar a bola. Taboclécio, em pânico, chuta para a barrinha e… é Gollllllllllllllllllllllllllllllllllll. Gol de Taboclécio”.
Os amigos se reúnem e se abraçam celebrando o gol. A zona pra cima do adversário era uma coisa obrigatória.
“Perdesse, otário. Vou dar aula na próxima pelada”.
Num universo tomado pelo politicamente correto – onde os velhos Trapalhões já estariam presos – a pelada segue contra todos e contra ninguém. Fazendo sempre parte desse imenso país que ama e respira futebol. Do seu jeito.

Confraternização

Desta vez, ao invés de marcarem num boteco, a confraternização foi no apartamento de Assis.

No ano passado, fizeram em um bar. Deram o azar de encontrarem uma confraternização de uns almofadinhas alvirrubros. Na mesa deles, havia uns oito ou nove barbianos. O mais escuro tinha a pele branco gelo e o cabelo repartido de lado.

Celso, já com o carburador meio encharcado e sem controle do volume do som, disse: “setenta por cento da torcida do timbu tá naquela mesa”.

Um dos brancos rebateu: “tricolor só tem dinheiro pra tomar skol”.

Celso quis pegar ar, mas a turma segurou a onda.

“Tu vai dar atenção a esses atabacados, é? Deixa pra lá…”. – Ivan falou.

Por uns instantes, o clima acalmou. Mas à proporção que o consumo de combustível ía aumentando, qualquer gargalhada soava como provocação, qualquer “tomar no cu” era falta de respeito do adversário.

A bronca foi quando Celso, voltando do banheiro, resolveu entrar no campo deles. Foi até a mesa adversária e desejou um feliz ano novo. “Galera, na boa, eu queria desejar um ano novo cheio de paz, saúde e felicidades pra vocês…”.

“Claro, rapaz! Tudo de bom, pra vocês também! Somos da paz”, retribuiu um galego.

Celsinho completou: “… e que vocês continuem sem título e comemorando o hexa!”.

A confusão foi grande. Não fossem os seguranças do estabelecimento, tinha havido uma guerra.

Depois desse fato, ficou decidido que a confraternização de 2016 seria na casa de alguém. No sorteio, saiu o apartamento de Assis. Assis Mosca Morta.

Compraram um barril de chope e mandaram fazer uma feijoada. Cada um levou um brebote. Amendoim, castanha, salgadinhos, essas coisas.

Vez por outra, a turma fazia o seguinte ritual: uma rodada de caldinho e uma lapada de aguardente.

Josué já ía no décimo ou nono copo de chope, com a voz meio embolada ele: “se num amigo secreto, por exemplo, eu tirasse Allan Vieira, eu dava uma flanela a ele, pra ele deixar de jogar bola e ir tomar conta de carro”.

Tacinho perguntou: “e se tu tirasse Márcio Araújo?”

“Eu dava uma enxada a ele”.

A risadagem foi grande.

Na retrospectiva do ano, algumas recordações. Nomes como Mazinho, Chimbinha, Vágner, além de Allan Vieira e Mário Sérgio, foram escolhidos por unanimidade para serem titulares do time de perronhas de 2016. Para treinador, houve empate técnico entre Milton Meme e Deriva.

Quem soltou a maior perua foi Naldinho. “Tudo indica que vamos contratar Luis Fabiano”. Quase leva um babau.

Lembraram a viagem para Campina Grande. “Eu não esqueço daquela gostosinha chorando de alegria. Nunca mais vi aquele filé em jogo do Santa. Sou doido pra encontrar ela de novo”.

Até hoje, Josué se lembra daquela garota no jogo da decisão da Copa do Nordeste.

Ele só não recorda mesmo, como foi que chegou em casa depois da confraternização. O limite da lembrança é a hora em que fizeram um brinde e alguém disse que o chope havia acabado. Sabe que a bebedeira continuou, mas não sabe como terminou.

Josué acordou com marteladas na cabeça. Teimou em não abrir os olhos. “Puta que pariu, que ressaca do caralho!”.

Virou de lado e pegou no sono de novo. Sonhou com o Santa Cruz campeão em 2017.

Apostaço na Timemania

Amigos tricolores corais santacruzenses das bandas do Arruda, faz tempo que não apareço neste Blog. Depois que voltamos aos velhos tempos das cestas básicas, salários atrasados, essas coisas, pedi licença para tratamento de interesses particulares e dei um tempo.

Mas estou por aqui. Revigorado e renovando a esperança. Torcendo que tudo volte ao normal e que 2016 acabe o mais rápido possível. E que 2017 venha cheio de conquistas, felicidades e comemorações.

Daí, pra finalizar esse terrível semestre, mostrando que quem é cobra coral do gramado do Arruda não morre fácil, muito menos abaixa a cabeça, vamos entrar com a gota serena nos jogos da Timemania.

Pra quem ainda não sabe, a gente precisa manter o Santa Cruz entre os 20 melhores da Timemania, pois só assim, temos um bom percentual para abater a nossa dívida federal.

Esse Blog e a turma da Minha Cobra bolou uma ideia pra ajudar. O cabra que fizer cinco apostas, ganha um dos livros do Blog e concorre a um sorteio de duas camisas da Troça Minha Cobra – 2017 e uma camisa da lojinha do clube.

A regra é simples:

A cada cinco jogos realizados, o torcedor que apresentar as apostas na loja Cobra Coral, ganha um dos livros do Blog do Santinha e concorre a duas camisa da Troça Minha Cobra, uma camisa oficial de jogo e uma camisa casula da loja Cobra Coral.

Então, meu nobre! É correr pra loteria, ajudar o Santa Cruz a se manter entre os 20 primeiros e ir na loja Cobra Coral pra ganhar brinde.

Finalizou, mas para começar tudo de novo.

Meus amigos tricolores, final de ano é aquele período infernal para qualquer professor: aplicar milhões de provas, corrigi-las e lançar as notas e, o pior de tudo, escutar o chororó dos alunos incompetentes que não conseguiram passar.
Nesse turbilhão natalino, mal tive tempo de acompanhar as notícias de nosso Santinha. Escutei a entrevista de Alírio. Falou o que todos nós já sabemos: a crise financeira do clube desgasta a gestão e compromete os planos futuros. Pelo que me lembro – e pode pegar qualquer jornal da época – desde sempre o Santa Cruz vive com dívidas imensas. Há 30, 40 anos que essa lengalenga se repete.
O papo de que o Arruda vai ser leiloado deveria entrar para o rol dos mitos pernambucanos: a emparedada da Rua Nova, Bio do olho verde e a perna cabeluda. Era criança quando ouvia as notícias de que o Santa iria fechar. Os séculos passam e ninguém faz nada. Não estaria na hora de profissionalizar esse clube de uma vez? Permitir que capital árabe – por exemplo – administrasse o Mais Querido? Transparência e uma gestão enxuta e técnica são mais do que bem vindas.
Um professor amigo meu falou de uma entrevista na Rádio Jornal de um dos conselheiros do clube descendo o sarrafo na diretoria de futebol. Tininho é um caso específico de amor e ódio. Amado no primeiro semestre e odiado no segundo. Natural: ganhamos o PE e a Copa do NE, mas nos lascamos feio na Série A – e ainda fico me perguntando quem foi beneficiado com tantas contratações neste segundo semestre.
Tiago Cardoso se foi. Foi, é e será ídolo eterno no Santa Cruz. Algo como Nunes, Pedrinho, Givanildo e Mancuso. Mas acho inevitável reconhecer que a porrada de frangos que ele tomou na Série A contribuiu e muito para nossa queda. Fase é fase, companheiro. E ídolo é ídolo.
Eutrópio chegou com uma leva de novas contratações. Nosso novo treinador teve passagens pelo Fluminense, Chape, Ponte Preta e até esteve em terras pernambucanas entre as barbies girls. Desejo-lhe todo o sucesso do mundo nessa nova empreitada. Vamos ver no que vai dar – não tenho nenhum dom de profeta. Logo, só a bola rolando para saber se acertamos ou não.
Vai dar uma saudade danada de Keno, JP e Grafite. Fizeram bonito, não tem como negar. Outros não vou querer nem lembrar o nome de tanta raiva que fizeram. MM e Doriva, por exemplo, nem sei mais quem são esses senhores.
2016 foi um ano ambíguo. Tivemos duas grandes glórias e uma triste derrocada de volta à seribê. E, o mais triste de tudo, o acidente com a Chape vai marcar o futebol brasileiro para sempre. Foi muito bonito ver as homenagens em todos os estádios desse imenso país na última rodada do Brasileirão. Emocionante. Como seria bom se essa utopia de torcidas unidas se tornasse uma realidade.
Estamos olhando para trás e vendo o que se foi. 2017 já desponta ante todos nós. As esperanças se reacendem. Esse é o ciclo natural de todas as coisas. Ansioso para voltar ao Arruda, para torcer e vibrar pelo nosso Santinha. Ser campeão em 2017 no Pernambucano se tornou obrigação.
Este ano está finalizando. Mas nada acaba e tudo se renova. Finalizou, mas para que a roda da vida – como a serpente de Uroborus – possa voltar a girar. Assim como nossa paixão por essas três cores que definem uma nação inteira de loucos e santos.

Luto no futebol brasileiro. Texto escrito por Zeca e Gerrá.

Texto escrito por Zeca e Gerrá.

Não há nada mais misterioso e maravilhoso do que a vida. Mas a vida, em si mesma, só pode ser o que é por causa da morte. Esta finitude radical que nos persegue, esse abismo inelutável que todos estamos condenados a visitar é que torna a própria vida no maior de todos os abismos.
Mas a morte, sorrateira e inesperada, quando se instaura entre nós, deixa um rastro de peso e tristeza, um questionamento que nunca encontra uma resposta definitiva. Ainda mais quando arrasta, atrás de si, o gosto amargo da tragédia, dessa falta de lógica que deixa a todos sobressaltados.
Eu sempre tento ser racional quando me deparo com notícias de morte e tragédias. Aquela história de ficar dando uma de durão. “Ah, pra morrer basta estar vivo”. “A vida é isto mesmo”. Essas coisas.
Mas, vez por outra, me vejo entrando em contradição. Hoje foi assim.
Quando liguei meu celular, às 6 da manhã, vi a notícia postada por Milton Jr. no zap. Fiquei uns segundos parado, olhando para tela, tentando driblar a dor do que estava lendo. Até naveguei um pouco na ilusão de encontrar algo que desmentisse a verdade.
Quase sempre, não me comovo com a morte de quem não está perto de mim. Daqueles que não são do meu convívio. Mas nessa manhã, foi diferente. Não tive como controlar a tristeza e marejei os olhos.
Como bem disse meu amigo Duda, hoje a Chape é a equipe mais admirada e querida no Brasil. É o xodó do futebol brasileiro. A Chape, pra nós que somos os excluídos da fatia gorda das verbas de TV, é a referencia. A Chape é o futebol moderno que sonhamos. A Chape é o modelo que buscamos.
Depois que fomos eliminados, confesso que vinha torcendo fervorosamente por eles nesta Sulamericana. Agora, diante deste hiato, deste silêncio assombroso que se derrama sobre todos nós e que deixa o futebol brasileiro de luto, creio que só nos resta ser solidários na dor e na tristeza dos familiares, amigos e torcedores que enfrentam momento tão delicado.
Estamos atônitos. Poucas palavras já são excessivas diante dessa tristeza imensa. Nossa mais sincera homenagem à tripulação, jornalistas, jogadores e a todos que nos deixaram de maneira tão súbita. Que os familiares e parentes possam encontrar refrigério para dor tão imensa.
Nossa homenagem à grande Chapecoense!

Pra frente é que se anda.

Meus amigos tricolores, parece que um desânimo geral se abateu sobre a torcida do Santinha. Não apenas pelo rebaixamento e a péssima campanha do segundo semestre deste ano, mas pelo fato incontestável de que o passivo do clube e a falta de uma gestão realmente profissional – e digo isso em todos os sentidos – nos deixa temerosos de como será nosso futuro.
A boa notícia da despedida de Jadson não encobre a ida de Keno para o Palmeiras – agora extremamente valorizado, o que é justo – e a necessidade absurdamente urgente de uma reestruturação administrativa no clube para lidar com tantas dívidas fiscais e trabalhistas.
A nossa torcida lembra aquele filme O Náufrago com Tom Hanks (apesar de não ter naufrágio nenhum no filme): estamos desolados, perdidos, falando com um Wilson imaginário na esperança vã de que sejamos ouvidos.
Já citei aqui que o sócio de um clube é exatamente isso: sócio. O torcedor que contribui mensalmente com o time deve ser ouvido. Mas me parece que os ouvidos de nossa diretoria vão permanecer surdos por algum tempo. A esperança melhora um pouco quando sabemos que Alírio se reuniu com blogueiros e ativistas do clube para discutir nosso futuro.
Li no site oficial do clube que estão pensando em abrir uma linha de diálogo com a torcida. Isso tem que ser feito logo. Já está bom de tanto choro e vela. Enterra logo o defunto e vamos seguir a vida, pois pra frente é que se anda.
É preciso pensar na estrutura financeira do clube, na construção do CT, no elenco para o Pernambucano do ano que vem e em todas as competições que iremos participar. Principalmente, na minha opinião, a Série B.
Iremos enfrentar Goiás, Paysandu, Brasil de Pelotas, Criciúma, Vila Nova, Ceará SC, Luverdense, CRB, Londrina e a Barbie. Infelizmente, nossa incompetência e a do Inter podem ajudar a Coisa a permanecer, aos trancos e barrancos, na Série A.
Essa Série B é pedreira, mas não é impossível retornarmos à elite se houver uma administração comprometida com o resultado. E não duvido que em 2017 iremos voltar a vibrar com o Mais Querido no Pernambucano.
Acho que o tempo de ficar se lamentando já foi. Encheu o saco essa choradeira: “Levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima”. Isso não significa, de maneira alguma, fazer vista grossa para os erros e a incompetência que tomaram o Arruda. Ao contrário, é hora de ser mais participativo, exigir transparência e cobrar resultados.
Só assim poderemos construir uma embarcação e sair do naufrágio real em que nosso amado Santinha se encontra. E jamais esquecendo que um dos traços fundamentais de nossa tradição – e que herdei do meu pai e de todos os torcedores apaixonados pelo clube – é a garra. A velha e boa garra tricolor.

Existirmos: a que será que se destina?

Meus amigos tricolores, mesmo com essas belas vitórias da Seleção de Tite – ainda mais com um 3×0 convincente contra a Argentina de Messi – ainda me sinto meio morgado para vibrar por este time. A lapada de 7×1 contra a Alemanha só vai ser apagada quando formos hexa campeões do mundo. Essa derrota-humilhação ainda vibra no fundo da alma. Até lá, fico só com meu Santinha mesmo.
Trata-se de uma questão existencial: na alegria e na tristeza, na riqueza e na pobreza. O sabor do último jogo no Arruda contra o América me fez pensar que a vida continua, a bola não para e o mundo gira sempre. Foi especial encontrar todos os apaixonados lá: Gerrá, Sama, Naná e sua trupe do Poço.
A vibração da torcida foi incrível. Parecia uma final de campeonato. Mas não era. O sentido da existência é moldado pela ambiguidade, pelo mistério e a esperança. No campo, neste momento crucial da vida onde a vitória é tão desejada, nos revelamos naquilo que temos de melhor e pior.
Além do mais, duas coisas me chamaram a atenção naquele jogo. Duas coisas simples, diga-se de passagem, mas relevantes pelo sentido que carregam.
Eu estava na arquibancada tomando uma cerva e acompanhando o jogo quando um torcedor, Vitor Salgueiro, se aproximou.
“Meu velho, vocês deveriam escrever no Blog do Santinha sobre a bandeira do clube. Isso é uma vergonha”.
Enquanto ele dizia isso, apontou para a bandeira tricolor que paira incólume sobre o Arruda, acima da tribuna. Realmente, era vergonhoso. A bandeira principal do estádio parecia traduzir a situação moribunda do time: está acabada, rasgada, surrada, velha… um trapo.
Quem será o responsável por esta bendita bandeira? Porra, até aqui no Blog a gente faz uma cotinha para comprar uma bandeira decente e trocar aquela velharia.
Outra coisa que me chamou a atenção foi a falta de um placar. Comentei isso com Sama:
“Quem é o responsável por isso?”
Sou da época em que o placar era trocado manualmente. Mas também fui à estreia do placar eletrônico. E fui ao jogo em que nem placar tínhamos mais. Bastava, por enquanto, colocar um manual mesmo. Bonitinho e funcional. Acho vergonhoso não ter placar nenhum no Mundão.
Questões simples e que demandam soluções simples. Basta querer fazer.
Por ora, vou pensando no final do ano, nas biritas homéricas que vão surgir e no próximo ano com os novos campeonatos. E, claro, no jogo de hoje contra o Coritiba. Mais uma vez, acompanharei via rádio. Torcendo, torcendo sempre. Aqui, no Santa Cruz, meu coração é pleno – absurdo, lógico ou sem sentido, mas pleno.
Vai entender coração de torcedor. Existirmos: a que será que se destina?

Conversa

Despretensiosa, a conversa rolava solta. Adalberto nos contou uma história que na família dele, um primo namorou quase dez anos com uma moça. Faltando menos de um mês pro casório, a noiva desistiu do enlace. Sem apresentar nenhum motivo, ela não quis mais casar.

— o desmantelo foi grande, – disse Adalberto – minha tira foi até socorrida. Lasca é que com menos de seis meses ela tava casada com outro. Um cara que apareceu do nada.

— oxi, só pode ter sido gaia! – setenciou, Luizão.

— foi não. – Adalba retrucou.

O assunto rendeu um bocado. Uns a defender o noivo, outros a defender a noiva. Levantamos várias teses sobre gaia e não chegamos à conclusão nenhuma.

— Gaia é um negócio meio cultural – falou, Farol de Milha.

— Como assim, cultural? – perguntou Tadeu.

Alicate tomou a frente de Farol de Milha e explicou.

— Doido, tem lugar por aí que o cara tem não sei quantas mulheres. Outro dia eu ouvi dizer que nos índios, num tinha essa de casar não. As índias fodia com quem quisesse. É cultural, esse negócio de gaia.

— E as cachorras, ali é que é onda. A danada fica no cio, vem um e cheira, vem outro e lambe, vem um bocado de cachorro atrás dela, sarra, se esfrega, mas a miseravi só trepa com um. Eu acho isso, arretado! Imagina se a gente fosse assim – Luizão falou e deu uma gaitada.

A prosa tomou outro rumo. O reino animal. Não sei quem da turma veio com uma história que o carrapato da capivara transmite uma doença que pode matar seres humanos. Contei que já havia comido carne de capivara.

— Ainda bem que o carrapato é no couro, não é na carne – disse, Adalba.

— É proibido comer carne de capivara! Tadeu falou.

— Tu agora é do IBAMA, é? – Luizão perguntou.

E a turma começou a debater sobre a proibição de se comer carne de capivara. Uma bancada argumentou que é proibido caçar, mas comer a carne pode. A outra defendeu que se não pode caçar, não pode comer. O impasse rendeu um bocado. Outra rodada de cerveja.

A sabedoria de Luizão falou mais alto.

— Vocês tão tudo errado! E o IBAMA vai entrar na casa dos outros pra ver quem tá comendo carne de capivara?!

Pronto. A pauta mudou pra discussão sobres os motivos que fazem o IBAMA não conseguir atuar de forma eficaz.

“Os caras só querem comer bola”

“O IBAMA é pequeno para o tamanho do Brasil”

“O governo quer lá saber de porra de IBAMA, de bicho, nem de preservação”

Aí, Adalberto soltou a frase: O Governo não que saber do povo, imagine dos bichos!

Foi o gancho para se falar de política. Corrupção, a eleição de Olinda, a tal da PEC, a insegurança, essas coisas.

— Falando em política, eu só quero saber se esse Trampe vai lascar a gente, como tão dizendo por aí? – indagou, Alicate.

— Num lascando minha cerveja e o Santa Cruz, pode lascar o resto! – disse Tadeu.

Adalberto deu um gole na cerveja. Lubrificou as cordas vocais e mandou sua opinião econômica.

— Rapaz, o pau só quebra no mais fraco. Pode ser Trampe, Obama, qualquer um. Agora, tenho pra mim que essa eleição de lá pode prejudicar um cabra feito Keno, um Grafite… Esse Trampe não gosta de negro, nem de brasileiro e nem de imigrante. Vai ficar mais complicado jogador daqui ir jogar lá.

— Então, vai ser bom pro Santa Cruz, né? – perguntou, Alicate.

— É lógico! – Luizão afirmou.

Ficamos alguns minutos em silêncio e começamos a falar de futebol.

A alegria que vem da arquibancada

Desci a Serra nas carreiras. Não queria chegar ao Arruda atrasado. Nas pressas, terminei sem combinar nada com ninguém.

Fui sozinho, pensando em ir para as cadeiras e dizendo pra mim que seria minha despedida de 2016. O último jogo. O derradeiro encontro com meu time, com minha casa, com meus milhares de amigos.

Na solidão do percurso até o Mundão , a tristeza insistiu em dominar. Mas venceu a alegria de tantos momentos bons, destes vários anos de Santa Cruz. O rolete de cana, minha bandeira, a flâmula com o timaço de 1976 que ficava pendurada na cabeceira da cama, eu e meu pai nas sociais, o gol de Célio, o ano mágico de 2005, a Sanfona Coral, as viagens e aventuras pela Série D, a cabeçada de Caça-Rato contra o Betim,  a Copa do Nordeste em Campina Grande, as infinitas amizades, as vitórias.

Dobro a esquina da rua do Canal e o mundo se torna colorido. Preto-branco-encarnado. Avisto o pessoal do Poço calibrando o fígado numa barraca da beira do canal. A turma da Kombi Coral. Naná, Peito de Pombo, Ninha, Dái e Boy. Perguntei por Oswaldo Titio e Diazepan. Um estava no interior, o outro no aniversário da filha.

Encontrar com esse povo do Poço é tomar uma injeção de otimismo e felicidade. Pra eles não tem tempo ruim.

“Gerrá, hoje só vem quem gosta mesmo!” – disse, Naná.

Conversamos um pouco e me mandei pra comprar minha entrada. Corri como se não houvesse mais ingressos.

Na calçada, perto da bilheteria, encontro Samarone e Zeca.

“Cadê tu, porra?” – Sama perguntou.

“Gerrá, caralho! A gente existe, porra!” – gritou Zeca, o filósofo!

O sorriso estampado no rosto dos doidos, me levou para arquibancada.

Encontramos com Naná e cia. Ficamos juntos. Bem acima do escudo, na linha do meio campo.

No gol de Léo Moura, uma explosão de felicidade. Parecia que o campeonato estava começando. Foi como se a gente estivesse gritando para o mundo que estamos vivinhos da silva. No apito final, abraços, sorrisos e esperança.

Fazia tempo que eu não sentia a vibração e o calor do cimento da arquibancada. Os bons ventos daquele lugar me fizeram esquecer que somos quase lanterna, que a seribê de 2017 nos espera e que nossa campanha foi uma vergonha. A alegria de hoje me avisou que ainda temos duas partidas no Arruda e que a Terra gira.

No próximo jogo, quero estar lá.