Despretensiosa, a conversa rolava solta. Adalberto nos contou uma história que na família dele, um primo namorou quase dez anos com uma moça. Faltando menos de um mês pro casório, a noiva desistiu do enlace. Sem apresentar nenhum motivo, ela não quis mais casar.
— o desmantelo foi grande, – disse Adalberto – minha tira foi até socorrida. Lasca é que com menos de seis meses ela tava casada com outro. Um cara que apareceu do nada.
— oxi, só pode ter sido gaia! – setenciou, Luizão.
— foi não. – Adalba retrucou.
O assunto rendeu um bocado. Uns a defender o noivo, outros a defender a noiva. Levantamos várias teses sobre gaia e não chegamos à conclusão nenhuma.
— Gaia é um negócio meio cultural – falou, Farol de Milha.
— Como assim, cultural? – perguntou Tadeu.
Alicate tomou a frente de Farol de Milha e explicou.
— Doido, tem lugar por aí que o cara tem não sei quantas mulheres. Outro dia eu ouvi dizer que nos índios, num tinha essa de casar não. As índias fodia com quem quisesse. É cultural, esse negócio de gaia.
— E as cachorras, ali é que é onda. A danada fica no cio, vem um e cheira, vem outro e lambe, vem um bocado de cachorro atrás dela, sarra, se esfrega, mas a miseravi só trepa com um. Eu acho isso, arretado! Imagina se a gente fosse assim – Luizão falou e deu uma gaitada.
A prosa tomou outro rumo. O reino animal. Não sei quem da turma veio com uma história que o carrapato da capivara transmite uma doença que pode matar seres humanos. Contei que já havia comido carne de capivara.
— Ainda bem que o carrapato é no couro, não é na carne – disse, Adalba.
— É proibido comer carne de capivara! Tadeu falou.
— Tu agora é do IBAMA, é? – Luizão perguntou.
E a turma começou a debater sobre a proibição de se comer carne de capivara. Uma bancada argumentou que é proibido caçar, mas comer a carne pode. A outra defendeu que se não pode caçar, não pode comer. O impasse rendeu um bocado. Outra rodada de cerveja.
A sabedoria de Luizão falou mais alto.
— Vocês tão tudo errado! E o IBAMA vai entrar na casa dos outros pra ver quem tá comendo carne de capivara?!
Pronto. A pauta mudou pra discussão sobres os motivos que fazem o IBAMA não conseguir atuar de forma eficaz.
“Os caras só querem comer bola”
“O IBAMA é pequeno para o tamanho do Brasil”
“O governo quer lá saber de porra de IBAMA, de bicho, nem de preservação”
Aí, Adalberto soltou a frase: O Governo não que saber do povo, imagine dos bichos!
Foi o gancho para se falar de política. Corrupção, a eleição de Olinda, a tal da PEC, a insegurança, essas coisas.
— Falando em política, eu só quero saber se esse Trampe vai lascar a gente, como tão dizendo por aí? – indagou, Alicate.
— Num lascando minha cerveja e o Santa Cruz, pode lascar o resto! – disse Tadeu.
Adalberto deu um gole na cerveja. Lubrificou as cordas vocais e mandou sua opinião econômica.
— Rapaz, o pau só quebra no mais fraco. Pode ser Trampe, Obama, qualquer um. Agora, tenho pra mim que essa eleição de lá pode prejudicar um cabra feito Keno, um Grafite… Esse Trampe não gosta de negro, nem de brasileiro e nem de imigrante. Vai ficar mais complicado jogador daqui ir jogar lá.
— Então, vai ser bom pro Santa Cruz, né? – perguntou, Alicate.
— É lógico! – Luizão afirmou.
Ficamos alguns minutos em silêncio e começamos a falar de futebol.