Naquele fatídico 09 de agosto, quando o juiz encerrou a partida, não recordo o que veio à minha cabeça. Lembro que fui tomado por um misto de tristeza e descrença. Não sei se enchi a cara. Faltou muito pouco, faltou quase nada, para eu acreditar que o Santa Cruz iria se acabar.
Aquele dois a dois, não só calou o Arruda. Deixou todos atordoados.
No dia seguinte, Aureliano, o Léo, escreveu um desabafo. Botou pra fora toda sua angústia e raiva. Como se estivesse falando para o mundo, em um dos trechos, ele escreve: “chega de tanto sofrimento, constrangimento, humilhação. A instituição Santa Cruz…”.
Léo pensou no pai. Sócio do Santa Cruz, frequentador assíduo do Arruda, como haveria acordado o coração cansado de guerra de Seu Zé de Felix.
Pegou o telefone e ligou.
— Papai, tudo bom?!
Lá de Vitória de Santo Antão, seu Zé de Félix, não escondeu sua tristeza. Por outro lado, não se intimidou com a infeliz realidade. Muito menos, perdeu a esperança. Repetiu para o filho, o que já havia dito de outras vezes.
— Eu ainda vou ver o Santa Cruz na primeira divisão.
Aquilo soou como um consolo para o filho. Aquele consolo que ao invés de acalmar, deixa o sujeito irritado. Léo não se conteve.
— Papai, pelamor de Deus, o senhor já tem 94 anos!
Fomos para outra série D. Passamos por cima de pau e pedra. Enfrentamos chuva, sol e sereno. Vencemos. Nos classificamos para terceira divisão.
Mas o inferno ainda era ali. Apenas tínhamos saído do fundo do poço do futebol brasileiro. Jogamos a sericê, paramos no meio do caminho e ficamos por lá. Era como se o sonho de ainda ver nosso time na série A, ficasse cada vez mais longe de se transformar em realidade.
Mais um ano na terceira Seu Zé de Félix, filhos e netos, sempre de braços dados com o Santa Cruz, acompanharam nossa façanha. No peixinho de Caça-Rato, naquele memorável gol contra o Betim, eles estavam no Arruda e viram o Santa Cruz ir para segunda divisão.
Fizemos 100 anos e disputamos a seribê. Ficamos por várias rodadas na porta de entrada do G-4. Ao final, não saímos da segunda. Pelo trauma vivido, para muitos, o fato de conseguir se manter ali, já foi um grande negócio.
Entramos em 2015. Seu Zé de Félix se tornou centenário. Outra vez ganhamos o estadual. E, de forma surpreendente, o mundo viu um time fazer um trajeto quase impossível para muitos. O time do povo, da poeira, da massa, está de volta a série A.
Na próxima quarta-feira, contra o Cruzeiro, Seu Zé de Félix vai confirmar de perto sua profecia. Irá ao Arruda para ver seu time do coração jogando de novo na primeira divisão.