A batalha da PM contra a festa nas arquibancadas do Arruda (Parte 1)

Amigos corais, meu lugar sagrado na arquibancada, junto ao escudo do Mais Querido estava me incomodando há algum tempo.

Não sei o que era, mas uma espécie de impaciência com a morgação.

Em muitos jogos, eu sentia falta da vibração da torcida, de músicas para empurrar o time. Via aquela multidão da Inferno Coral calada, ficava invocado, começava a puxar um coro que ninguém seguia. Como diz o Tom Zé, “Que porra!”

Antes de começar aquele jogaço contra o Bragantino, tomei uma decisão fundamental – fui para o lado esquerdo do estádio, onde estavam os bravos torcedores do “Portão 10 – Avante Santa Cruz”. Vou ver se o negócio ali é mais animado, foi o que pensei.

Era o único local da arquiba que tinha algumas bandeiras, música (um sujeito virado num trompete), bandeirolas e o principal – um bando de malucos que cantava e pulava o jogo inteiro.

Isso mesmo, camaradas. Durante 90 minutos os caras não aliviam.

Fiquei logo amigo do Lucas Souza, um camarada bem novo, sorriso largo, que ficava se mexendo pra todo lado, cantando, vibrando.

Mas o que me espantava era a espontaneidade. Ali, o maestro era a paixão coral.

Em vários momentos, a turma da “Portão 10” começava a puxar uma música e daqui a pouco a arquibancada inteira, sociais, estavam seguindo o mesmo canto. De arrepiar.

Foi graças a esse encontro, e aos papos com Pablo, que pude entender a luta desta pequena e raçuda torcida, para levar alegria e festa ao Arruda.

Breve história

Resumindo tudo, a Portão 10 é uma torcida organizada do estilo barra brava (como se vê nos principais estádios da América do Sul, onde a galera canta antes, durante e depois do jogo, seja qual for o resultado). Nasceu em 2007 com o nome de “Avante Santa”.

Passou por inúmeras dificuldades, parou de funcionar em 2012 por “vários problemas”, inclusive com a “principal organizada do clube”, que não vem ao caso destrinchar aqui, mas acabou firmando seu espaço, crescendo e ganhando a simpatia da massa coral. A história é bem bacana, inclusive pela consciência que os caras têm de que o Santa é um clube popular, e não pode se afastar nunca de suas origens.

Os caras têm pulmões de madeira. Também levam bandeirolas (coisa antiga nos estádios), além de bandeiras com frases voltadas para a cultura do clube. Recentemente, começaram a fazer paródias, como era costume da gloriosa e agora exilada Sanfona Coral.

“Seguimos na luta pelo diferente para trazer novamente nossa antiga torcida”, diz Pablo.

Perdão pelo trocadilho, Pablo, mas é uma torcida sem sofrência.

Tudo muito bom e bonito, é o que o leitor coral vai pensar.

Que nada, meus amigos. Eles enfrentam uma batalha, a cada jogo para driblar o “pode não” da PM.

PM: A tropa da morgação

A torcida do Santa não pode entrar ao estádio com papel picado, bandeira (por menor que seja), bandeirola, bobina de papel higiênico, nada de pirotecnia em geral, pano, enfim.

“Além da recorrente truculência e ignorância, sofremos com a censura em cima dos nossos trapos (bandeiras com frases que ficam na mureta) como “Sociedade Alternativa” e “Coral Antifa””, prossegue Pablo.

Ou seja, a PM “escolhe” o que deve ou não entrar, sem argumento algum, sem embasamento. Depende do humor, sem nenhum documento que defina critérios. Na linguagem jurídica, o nome disso deve ser “protocolo”.

“Além da recorrente truculência e ignorância, sofremos com a censura em cima dos nossos trapos (bandeiras com frases que ficam na mureta) como “Sociedade Alternativa” e “Coral Antifa”, tendo que aceitar as bandeiras que eles decidem deixar entrar, sem darem nenhum argumento ou embasamento para as proibições”.

“Além de termos as mãos atadas em relação aos artefatos festivos, como papel picado, bobinas e papel higiênico, pirotecnia em geral e principalmente nossas bandeiras (que por décadas foram marcantes na característica da torcida coral e pernambucana). Tudo com o argumento de que são “armas” para aqueles que eles não prendem”.

Depois da vitória, da comemoração pelos 3 x 1 contra o Bragantino, ficamos conversando um pouco na arquibancada, cheios de alegria.

Pablo então soltou uma frase que me parece a marca deste período absurdo em que vivemos:

“A batalha dos caras é contra a festa”.

Eles estão ganhando, mas a torcida do Santa tem a arte de resistir.

“Avante Santa, olê olê olê…!”