Uma noite inesquecível

Passava das cinco da tarde e Thiago manda um zap-zap para avisar que já estava no Shopping. Ele e mais uma centena de torcedores.

Meia hora depois, envia outra mensagem, poética e provocativa.

“Gerrá, parece que eu estou no centro da cidade, numa segunda-feira, depois de uma vitória do Santa Cruz”.

Logo em seguida o telefone toca. Era a primeira-dama. “Estou chegando em Boa Viagem.”

Não pensei duas vezes. Fechei um documento que tava fazendo, salvei, desliguei o computador e me mandei pra Esposende.

Cheguei logo depois das 18h e a loja estava entupida de gente.

Thiagão já me esperava na fila. Alessandra estava com as meninas, vendo umas roupinhas. E os corredores do shopping era todo Santa Cruz.

Uma coisa bonita de ser ver. Preto, branco, vermelho, sarará, galego, gordo, magro, rico, pobre, morena, velho, menina, moça. Todos juntos e misturados, como é a verdadeira massa coral.

— Como é contagiante, nossa torcida. Como é linda! – falo silenciosamente e seguro a emoção.

Na minha frente, um rapaz humilde, pergunta se a gente pode tirar uma foto dele. Era Gilmar. Estava sozinho e sua maior angustia era como iria fazer pra registrar o momento de encontro com os jogadores.

— Queres que tire foto tua com quem?

— Com todos eles.

De repente, uma vibração única toma conta do lugar. Parecia que o Santa estava entrando em campo. Nossos atletas haviam chegado.

Anderson Aquino, Grafite e Renatinho é sorriso puro. Thiago Cardoso, a tranquilidade de sempre. Raniel, um garoto ainda tímido no meio dos adultos.

A loja se transforma num verdadeiro caldeirão de gente. Molhado de suor, o simpático Alírio, o nosso presidente, é vibração pura. Faz selfie com alguns, abraça outros, cumprimenta todos.

A fila está cada vez maior.

Atrás de nós, uma família que mora no Curado. Pai, filha e avó. Cada um com uma camisa para ser autografada.

Minha pequena Sofia é ansiedade pura. Com as mãozinhas suadas, diz que está doida pra ver Grafite.

De repente uma turminha que está a nossa frente, começa a puxar: “ô, ô, ô, o Grafite chegou, o Grafite chegou”.  Todo mundo olha e a gargalhada é geral.  Era um sósia do nosso craque. Um sujeito moreno, quase preto, e careca. O cabra era a cara de Grafite.

E assim foi a noite. Como bem disse Thiagão, o Shopping Center que já foi considerado o maior da América Latina em linha reta, ontem ficou parecendo o Mercado da Encruzilhada em dia de jogo do Santa Cruz.

E eu, com o coração lavado de felicidade, vou guardar a noite de ontem na minha caixa de boas recordações.

Esses nossos heróis anônimos

Quase sempre, antes de pegar no batente, passo uma vista na minha caixa de correio eletrônico.

Hoje no meio de um monte de mensagens sem muita importância, vejo um e-mail enviado por Gileno, o famoso Parral da nossa pelada. O título do assunto é bem objetivo e escrito em caixa alta: TIMEMANIA.

Clico na mensagem e me deparo com o seguinte:

Tricolores,

Estou de volta com as apostas da TIMEMANIA. Os tricolores da expansão podem deixar o valor da aposta (R$ 10, ou 20,) com Diogo Melo (Gerente da Caixa) facilitando a arrecadação.

Estarei recolhendo até quarta-feira (26/08) para fazer as apostas na quinta-feira.

Se conhecerem outros tricolores e quiserem divulgar a empreitada, manda entrar em contato comigo. Segue a relação que tenho atualmente.

No anexo, Parral coloca uma prestação de contas sem firulas, mas que dá uma credibilidade danada a ação. É uma simples planilha Excel com o nome e o contato dos contribuintes e os respectivos valores que a turma dar mensalmente.

Antes que alguém pergunte quem é esse tal de Gileno, ele é sócio do Santa Cruz, seu pai e sua mãe são do Santa Cruz, os três filhos dele torcem pelo Santinha, a esposa é do Santa, e pra finalizar é meu irmão.

Perguntei a ele como havia surgido a ideia.

— Quem deu a ideia foi Adilson Lira. Aí, eu comecei a mobilizar uns tricolores. Aos poucos o grupo foi aumentando.

Na primeira convocatória, eles conseguiram uns dez adeptos. E bem rápido, chegaram a trinta apostadores.

A lógica da ideia é simples: o maior atrapalho é a falta de tempo para alguns irem até uma casa lotérica.

E é verdade. Perto da minha casa, por exemplo, não tem nenhuma loteria.

Fico aqui no pensamento e na viagem…

Imaginem se em cada repartição, nas fábricas, nas empresas, nas torcidas organizadas, igrejas, terreiros, alguém promovesse uma ação desta de juntar alguns torcedores corais santacruzenses das bandas do Arruda e fazer jogos na Timemania! Não precisava nem ser toda semana. Bastava uma vez no mês, que iria botar nosso Santa Cruz entre os vinte times melhores colocados nesse jogo.

Certa vez, o presidente Alírio Moraes comentou sobre esses heróis anônimos. Tenho pra mim que ele se referia a gente como Gileno e Adilson.

Já comprei a minha

Ontem, aproveitei a hora do almoço e me mandei para o Tacaruna. Do Recife Antigo pra lá, foi bem rápido. O trânsitoestava tranquilo e calmo.

Entro na Esposende, passo uma vista na loja. O movimento está meio fraco. Um sujeito moreno e quase careca se aproxima e, antes que ele me ofereça sapato,  eu já vou perguntando se tem camisa do Santa Cruz.

Os olhos do vendedor brilharam.

— Tem, chegou agora de manhã. – ele diz e me mostra a camisa na vitrine.

Peço uma, tamanho M.

Eu estava ali esperando o careca trazer minha camisa. Daí, um rapaz gordo, de bermuda estampada entra na loja com a irmã.

A menina era um pouco mais velha do que o gordo, baixinha e era cara dele. E foi ela quem perguntou a vendedora se tinha a camisa nova do Santa e pediu uma tamanho XG.  E no final, ela fez um crediário. Com certeza era irmã do gordo.

O careca vem vindo. Escuto ele comentar com uma moreninha, “puta que pariu, esse Santa Cruz é foda!”. Ela ri e balança a cabeça concordando.

Puxei conversa com Careca. Perguntei como estavam as vendas e tal e coisa. Ele começou a falar de sapatos, mas levei o papo pro rumo das camisas. Careca me disse que num tem artigo mais fácil de vender do que camisa do Santa Cruz.

— Dia dos pais, em agosto,  numa das lojas do centro, uma só vendedora mandou ver e vendeu praticamente 15.000 reais de camisas do nosso Santa. – ele comentou.

— Danou-se, só uma loja vendeu  isso tudo? – perguntei.

— A loja, não. Uma vendedora. É uma arrombada, né não?

Entra um mago de mãos dadas com uma galega. Acho que era a namorada. A galega tem um piercing no nariz e uns olhos de peixe. O mago, vestido com o nosso padrão número um, é outro que chega para comprar a promoção da Esposende.  Ele pede uma, a galega pede outra.

Quando vi a galega comprando, lembrei da primeira-dama. Tirei uma foto da camisa,  mandei pra ela e falei da promoção.

Em poucos instantes, são cinco camisas vendidas.  O mago e a galega já saem da loja vestidos com o novo manto.  Vejo eles fazendo um selfie e dando uma bicota.

Realmente, meu amigos, Careca tem razão quando diz que o Santa Cruz é foda.  Não sei quantas camisas foram vendidas até agora, mas pra nossa torcida a crise ainda não chegou.

Eu mesmo, estou pensando seriamente em domingo ir até Feira Nova, prestigiar essa história do Santa Cruz sem Fronteiras. Imagino a farra como vai ser.

Do jogo de hoje,  já estou com o ingresso nas mãos e já marquei com alguns amigos num espetinho perto do Arruda.

Minha dúvida é se vou com a camisa nova ou se visto a que está dando sorte.

Um texto pra ser lido, relido, compartilhado e arquivado

Logo cedo, Paulo Aguiar me manda um zap-zap com um texto escrito por Ugo Giorgetti e que foi publicado no Estadão.

Giorgetti é cineasta. Entre tantos outros, fez os filmes Boleiros – Era uma vez o futebol e Boleiros 2 – Vencedores e vencidos. Não só pelo fato de reverenciar nossa torcida, mas pelo contexto geral, o texto é um primor. É daqueles que você ler e dar logo vontade de mandar para os bons amigos.

De ontem pra hoje, já perdi as contas de quantas vezes eu li. Nem me lembro de quantas vezes comentei e compartilhei com os amigos.

Sim, também são de Ugo Giorgetti, as palavras que apresentam o volume branco da Trilogia do Blog do Santinha.

Para quem não viu ainda, o link é esse:

http://esportes.estadao.com.br/noticias/futebol,o–o–o–o-grafite-chegou,1744797.

Vale ler, curtir, compartilhar e, principalmente, guardar bem guardado. Nele a gente encontra joias como estas:

“Uma torcida como a do Santa Cruz é tão impressionante que transforma o que ocorre em campo. Você fica sem saber se assiste a um grande jogo ou não. E isso pouco importa. Importa que se aquela multidão ensandecida se deslocou para lá, arrastando seu delírio e sua alegria, o jogo já é um grande jogo antes de começar.”

“O futebol visto não como conforto e comodidade, mas como loucura.”

“Se o futebol brasileiro quiser se recuperar e voltar a ser o que já foi, precisa olhar para lugares como o Arruda.”

“Sei lá se foi um grande jogo, mas o espetáculo, que vi integralmente, foi magnífico.”

E pra finalizar, o cabra escreve:

“… no meio da multidão, tenho certeza de que ouvi, temperadas a cerveja, as vozes dos amigos Inácio França e Samarone Lima, criadores do lendário Blog do Santinha, gritando “ô,ô,ô, o Grafite chegou!”.

Né por nada não, mas Ugo Giorgetti deveria ser lembrado para sempre nas dependências do Arruda. Esse, sim, merece ser homenageado.

Conversa de feira

Fui ontem ao Arruda. Consegui chegar antes das 18h, a tempo de tomar uma cerveja, bater um papo e encontrar alguns amigos.

Pra variar, Samarone perdeu o jogo. Ele achava que a partida seria às 19h30, começou a beber por volta das 16h e quando pensou em sair, já estava com a cuca cheia de cachaça e faltava somente quinze minutos para bater o centro.

O jogo não foi lá essas coisas. A chuva e o vento tomaram conta da apresentação. Mas, como diria o filósofo, “o que vale é os três pontos”.

Bom mesmo foi ver a animação hoje na feira.

Sou daqueles que gosta do movimento e da conversa no meio da feira. Prefiro a companhia dos feirantes, à solidão de um supermercado.

Além disso, o preço dos produtos é bem mais barato.

Na minha agenda, o começo da manhã das quartas é destinado a fazer feira. Acordo, visto o manto sagrado, levo as meninas ao colégio e me mando pra Casa Amarela.

Queijo coalho eu compro no mercado. A turma do box em que faço a compra, é quase toda do Santa Cruz. O sorriso dos caras estava de um canto a outro da boca.

— É Grafite, meu véi! O negão né brochador, não!

Gritou o moreno de bigode que sempre me despacha, pra um magro vestido com uma camisa amarela. Me entregou um pedaço de queijo e perguntou:

— E aí, dotô, o que tá achando?

— Tá meio salgado.

— Não, o Santa?

— Ah…., tá chegando. Grafite fora de forma tá fazendo um gol por partida, imagine quando o bicho tiver no ponto.

Bigode sorriu.

No outro lado, um gordinho fez uns passinhos e cantou:

— acabou o caô / o Grafite chegou / o Grafite chegou.

A gargalhada foi geral.

Provei umas castanhas e fui para o pátio da feira.

Ali a resenha é grande. Apesar do desprezo do poder público, o pessoal é sempre bem animado. Uns mais, outros menos. Mas no geral, a piada, a tiração de onda e alegria dominam o espaço.

Passo no freguês da acerola. A plaquinha de papelão avisa: 1 é R$ 3,00.

Uma moça faz a pechincha: 2 por 5?

— É leve. Dá pra fazer! Mas num se acostume não, senão eu quebro!

Um altão com voz aguda está aos berros:

— Baixou. Baixou. Quem vai querer a banana!

O outro grita:

— Te lasca!

Chego à barraca da freguesa das verduras. A alface tá bonita, danada! E o precinho do tomate está na medida, dois reais. Em se tratando de futebol, a dona é torcedora do time da Abdias e o marido é tricolor coral santacruzense das bandas do Arruda.

— Que cara é essa, tá triste? Cadê o maridão? – eu pergunto.

— Desde sábado que aquele miserável bebe! Quando a porra do time dele ganha, eu já sei que vai dar problema. Eu queria que aquela porra se acabasse.

— Que é isso, freguesa?! Faça isso não! Desejando que meu time se acabe… – eu disse.

— Não. Seu time, não. Eu queria é que aquela desgraça se acabasse na cachaça.

Lembrei de Samarone.

Peguei minhas verduras e sai assobiando, “acabô o caô, o Grafite chegou, o Grafite chegou”.

Exilado por um instante

Por aqui, pra quem não é acostumado, o que é perto sempre é um pouco longe. Corri o que pude, mas só consegui chegar a tempo de ver os melhores momentos da primeira etapa e os quarenta e cinco minutos finais.

Tenho pra mim que estar longe de um jogo como o da última terça-feira, deixa o sujeito mal-humorado, nervoso e chato. Eu, por exemplo, já sentei no sofá reclamando do empate. “Como é que o time faz um gol e dois minutos depois leva outro?!”. “De novo. Cruzou na área, essa defesa leva gol”.

Até fazermos dois a um, fui só reclamação. Lembro que momentos antes, chamei Luizinho de “doente”, Lelê de “idiota” e Anderson Aquino de “burro”. A primeira dama até ironizou: “no jogo contra o Botafogo, tu devia ir assistir nas sociais”.

Mas bastou Luizinho estufar a rede adversário, que o peso e o azedume foram embora. Corri pra janela e gritei pra toda Vila Mariana ouvir: é Santa Cruz, porra!

Ao final, quando fechamos o caixão do Bahia, gritamos e pulamos feitos malucos. Até o cachorro do vizinho comemorou.

Passada a euforia, uma mistura de alívio e saudade chegou de com força. Os amigos no Bar de Abílio, a Avenida Beberibe, a cerveja na beira do canal, o Tepan, a turma do Poço da Panela, a massa coral em festa.

Ah, como eu queria estar ali pra abraçar o povão.

Nessas horas, dá pra sentir um pouquinho o que sentem os infinitos exilados tricolores corais santacruzenses das bandas do Arruda por esse mundo a fora. A saudade não é do Recife, a saudade é do Santa Cruz.

No próximo sábado ainda vou estar por aqui. Melhor ainda, é que o jogo contra o Oeste não vai ser mais em Itápolis. Vai ser em Osasco.

E nossa sorte é que os limites do Arruda ultrapassam todas as fronteiras. Já tem uns exilados aqui em São Paulo se organizando para ir ver o Santa Cruz e eu vou no meio. Raul Cavalcanti, Danilo Souza e João Victor  confirmaram presença. Pra engrossar o cordão, meus amigos Paulo e Isabel, também irão.

Só me falta aparecer um sanfoneiro, uma zabumba e um triangulo pra animar a festa. Mas aí é querer emoção passando da conta.

Por onde vou, o Santa Cruz está!

Tirei férias. Juntei a família e me mandei para São Paulo.

Por aqui, pra quem está acostumado com nosso belo calor, o frio é daqueles que faz o sujeito ajudar a economizar água do chuveiro. Por aqui, o povo continua andando avexado no meio da rua. “Papai, todo mundo anda correndo aqui, né?”, falou uma das pequenas.

Quando entro no gozo das férias, sou daqueles que procuro me desligar de tudo. Faço questão de não atender ligações telefônicas. Evito as tais redes sociais. Pelo visto, vamos chegar num tempo em que o sujeito viajará e na volta não terá nenhuma novidade para contar. Muito menos fotos para mostrar. A turma sai de férias e se dana a mandar fotos por zap-zap, postar o que está fazendo no facebook.

O que não consigo mesmo, é me desligar do Santa Cruz. Nem ele de mim. Ontem, levei as pirralhas para conhecer o Butantã. Por sinal, um passeio pra lá de agradável. E aí, num dos museus, encontro o nosso Santa em várias cobras corais. Mais pra frente, umas das programações do Instituto é deixar o público manusear algumas cobras. Avisaram que seria um jibóia e uma cobra do milho. Andamos, visitamos outro museu, paramos para fazer um lanche e no horário marcado fomos para o serpentário onde seria feita a atividade. A jibóia estava lá, mas a cobra do milho faltou. No lugar dela, a cobra coral.

Hoje perambulamos pelo centro. Nas imediações da 25 de março, o movimento é grande. De camelô a cartomante, tem de tudo. Já no Mercado Municipal a turma não alivia no preço. Tirando o sanduba de mortadela, o sujeito paga caro e come pouco.

Final da tarde, fui conhecer uns amigos novos. É que quando resolvi viajar para terra da garoa, comentei com Esequias. De pronto, ele me botou em contato com um casal paulista, Isabel e Paulo. “Gerrá, eles são gente fina. Ela é bem simpática. Ele, Paulo, é um Samarone da vida. São torcedores da Portuguesa”.

Nos encontramos na saída do metrô da Sé. Em poucos minutos, estávamos sintonizados como se nossa amizade fosse bem antiga. Uma conversa boa danada na escadaria da Catedral que terminou logicamente num bar e o futebol foi o assunto principal. Perguntei a Paulo se eles estavam naquele jogo de 2005, na seribê, contra a Portuguesa. Falei que a gente tinha ido com a Sanfona Coral. “Não sei se você lembra, mas na torcida do Santa tinha uma turma tocando forró”, eu disse. “Claro que sim. Foi ali que vi que a torcida de vocês é fantástica. Tenho a maior admiração pelo Santa”.

Paulo e Isabel tem os três volumes da trilogia do Blog. Tem camisa do Santa Cruz,  canecas, cobrinhas e até o álbum de figurinhas.

Não tem jeito, meus amigos. Quem é Santa Cruz não desgruda dele. Que seja assim. Neste sábado, vou estar ligado no jogo contra o Criciúma. Terça é o Bahia. E no outro sábado, dia 01, espero que a turma do marketing invente uma promoção do tipo “Turista Coral em Sampa” ou que eu arrume por aqui, uma turma boa de exilados Tricolores Corais Santacruzenses das bandas do Arruda que queira ir pro jogo contra o Oeste.

Dor x Esperança

O texto abaixo foi publicado no www.santacruzpe.com.br, o site oficial do nosso clube. Que por sinal, tá bem bacana e com notícias atualizadas. Fizemos questão de republicar, porque pra nós, Raniel é obra-prima que deve ser preservada.

Não é só por Grafite que a torcida do Santa Cruz espera. Raniel, um dos mais habilidosos jogadores revelados pelas divisões de base do clube nos últimos anos, está treinando com o resto do elenco para só voltar a campo no mês de setembro, quando termina a punição imposta pelo STJD.

Da suspensão e da cocaína encontrada em sua corrente sanguínea, qualquer um que acompanha minimamente o noticiário esportivo já está cansado de saber. O que poucos torcedores sabem é que, com ele dentro de campo ou proibido de jogar, o clássico Dor x Esperança é jogado todos os dias no coração de Raniel.

Desde pequeno, Raniel conhece o sofrimento de perto. Ainda criança, quando tinha apenas seis anos, seu pai morreu. Como e do quê,  não sabe. Nunca lhe contaram. “Só sei do rosto dele porque já vi umas fotos, mas não tenho lembrança nenhuma”. Atenção e carinho da mãe era uma coisa tão rara que uma ex-patroa dela, dona Dione, não aguentou ver o menino largado em casa, sem banho, sem roupas, sem cuidados e se ofereceu para criá-lo.

Dos oito aos 16 anos, Raniel viveu na casa dessa mulher, uma senhora cujos filhos já eram adultos. Ela pagou escola particular para o menino que, até hoje, só se refere a ela como “minha mãe”. Graças a Dione, ele pôde estudar até o oitavo ano do Ensino Fundamental e treinar na escolinha do Santa Cruz. Nessa época a Esperança virou o jogo e ganhava de goleada. O contato com a mãe biológica era mínimo e isso não era coincidência.

Uma tarde, quando voltava do treino de Futsal na quadra do clube, ele estranhou a movimentação em frente à casa onde vivia, perto do clube Madeira do Rosarinho. ‘Mãe’ Dione havia sofrido um ataque cardíaco e morreu no hospital. “Chorei sem parar, foi o dia mais triste da minha vida”. Naquele instante, a vida de Raniel havia mudado completamente.

Não havia outro jeito: ele teve de voltar para a casa da mãe, que a essa altura morava numa favela em Chão de Estrelas. Crack, cocaína e maconha passaram a fazer parte da rotina de todos ao seu redor. Era a Dor tomando as rédeas da sua vida novamente. “Todo mundo que eu conheço lá, cheira e fuma, mas eu sempre me mantive longe porque só tinha uma coisa na cabeça: ser jogador de futebol”.

Nesse período, as únicas refeições saudáveis que fazia eram aquelas servidas na concentração da base.
Então, numa festa da comunidade, madrugada de sexta para sábado de 2014, lhe ofereceram uma carreira de cocaína. Era a enésima oferta daquelas que lhe faziam. E a primeira que ele aceitou.

“Nem lembro do que senti. Sabia que ia ter um jogo do Pernambucano na quarta-feira, mas não imaginei que daria problema”. Deu. Nem jogar ele jogou, ficou no banco, mas foi sorteado para o antidoping. O resto da história é conhecida. Parecia que a Dor venceria o jogo da sua vida.

“Sinceramente, acho que o flagra no antidoping foi obra de Deus. Sem isso, talvez eu tivesse continuado a me drogar e jogaria tudo fora. O flagra e a ameaça de punição me deram medo, me fizeram parar para pensar no que eu quero mesmo da vida. Quero ser jogador de futebol, quero sair do Santa Cruz para o Real Madrid. Tenho bola para isso, confio no meu futebol”.

Hoje, Raniel vive num apartamento alugado pelo clube junto com a avó Marinalva e a irmã de 15 anos. Todos os meses, se submete a exames de sangue pagos pelo Santa Cruz para comprovar que está livre da cocaína. Todos os exames deram negativos.

Do mesmo jeito que Raniel, a Esperança é implacável nos contra-ataques.

Na bola e na raça

Meu caro Sama, tu não sabe o que perdesse! Com um a menos desde o final do primeiro tempo, perdendo de um a zero, viramos o jogo e vencemos por 2 a 1. Foi lindo! Um privilégio para os 10.000 tricolores corais santacruzenses das bandas do Arruda que puderam ir. Fazia tempo que eu não via um time jogar com tanta raça.

Rapaz, tu acredita que assim que entrei no estádio, levamos um gol? O cara cruzou alto da direita e nossa defesa, pra variar, dormiu no ponto.

Fiquei invocado. Perder em casa para um time treinado por Mazola Jr e que tem Pingo no ataque, seria o fim da picada.

Mas não demorou muito e tomamos as rédeas do jogo. Dominamos e sufocamos ele. Só faltava alguém pra botar a bola para dentro. Pena que Grafife ainda não está podendo jogar. O tal do Natan é de fazer dó. É a mais nova piada. Quando ele pegava na bola, um sujeito que estava perto gritava: tu né cachorrão não, tu é a molesta dos cachorrro. Murrinha!

O gol de empate estava bem maduro. Só que no finzinho do primeiro tempo, Sacoman, que já estava com amarelo, foi imprudente e deu um carrinho. Danado é que a jogada era uma saída de bola do nosso adversário. Pixotou geral, o tal do Sacoman. Aqui pra nós, esse rapaz parecia até que jogava bola, mas o bicho é fraco. Tem uma cara de menino criado com vó. Tu sabe que eu sou arretado com zagueiro que tem cara de menino buchudo.

Nessa hora da expulsão, um cidadão que estava um pouco atrás, gritou: “pqp, o cara sair de casa uma hora dessas pra ver uma merda dessa. Era melhor eu ter ficado assistindo faroeste na televisão”.

Bom, nossa sorte é que o primeiro tempo acabou.

Ao meu lado, um senhor gente boa sentenciou: “a gente vira esse jogo, você vai ver”.  Bicho, o treinador fez umas mexidas e acertou em cheio na arrumação do time. Tirou o Cachorro da Molesta e botou Nininho. Puxou Bruninho pro meio, deslocou Marlon pra zaga e Renatinho caiu mais pra lateral-esquerda. Pense numa ciência que deu certo! Mesmo com um jogador a menos, continuamos donos da situação. E aí, João Paulo, como nos velhos tempos do estadual, destruiu. Fez um golaço. Saiu driblando e, de fora da área, bateu no canto do goleiro.

Fomos ao delírio. Rapaz, eu vi a hora o senhor gente boa, o que disse que iríamos virar, ter um troço. Ficou pálido e massageando o coração. Em pensamento eu pedi a ele: “homi, num morra agora não. Imagina, se ele tivesse um troço”.

O time continuou pra cima. Dominando. Jogando bem e a torcida jogando junto. Imagine que até Nininho estava bem em campo. O segundo gol era somente questão de tempo, só que o cansaço e o desgaste foi batendo e teve nego que não aguentou. Quando Marcelotti quis dar um gás no ataque e chamou Luizinho, Marlon pediu penico. Entrou Néris. O bicho segurou a onda. Não comprometeu. Jogou bem. Um pouco depois, nosso técnico chamou Luizinho. Renatinho tava morto e saiu. E não é que viramos! E foi Luizinho quem partiu pra cima e cruzou rasteiro pra nosso artilheiro Anderson Aquino decretar a vitória.

Camarada, daí pra frente nem lembrei da minha sinusite e dor na garganta, quando o time deles pegava na bola, me esgoelava gritando e vaiando.

O senhor do meu lado estava ao ponto de enfartar. Tenho pra mim que de lá ele foi direto pro Unicordis.

Ao apito final, a alegria tomou conta. Nada melhor do que ganhar na bola e com raça. Quando isto acontece, a massa coral se acha verdadeiramente representada em campo.

Ganhamos, poeta. Ganhamos. O time é outro.

O povão está em festa!

 

Terça-feira, não tem desculpa. Todos ao Arruda!

Parece mesmo que recebemos uma transfusão de sangue. O time, que antes sofria de  uma anemia crônica, agora é outro.

Saímos da UTI e estamos bem perto de ter alta.

Digo isto porque a sala dos rebaixados está somente a três pontos da gente. Mas por outro lado, se engrenar uma boa sequência de vitórias, a gente entra de vez na briga pelo G-4.

Sim, como eu ia dizendo, somos outros.

Basta ver a beleza do gol do nosso pirralha. Pra fazer um golaço como o de Renatinho, o cabra precisa ter acima de tudo, auto-confiança e alegria correndo nas veias.

Se não me engano, já são sete partidas sem perder, cinco sob o comando de Marcelotti. É certo que pegamos o embalo.

E agora, meus senhores, chegou a nossa hora. Se nosso esquadrão saiu da UTI, a gente precisa sair de casa e correr pro Arruda. Com nossa torcida em campo, esse time engrena e dispara de vez.

E imaginem quando Grafite estiver pronto. Ninguém segura o  Mais Querido.

Como bem disse Alírio, nós somos os heróis ocultos desse clube centenário. Certíssimo presidente. Desde nossa fundação, tem sido assim. A massa coral é o principal combustível, é a força motriz desse clube centenário.

E agora, é hora de vestir a camisa, chegar junto e jogar com o time. De defender, atacar, de bater escanteio, de matar a jogada adversário, driblar e fazer gol.

Hora de intimidar o adversário com nosso grito. De pegar os meninos que estão de férias, juntar a família e se mandar pro Arruda. Convocar os vizinhos, os amigos. Distribuir ingressos, pagar a passagem e dar carona.

Já dei uma olhada na previsão do tempo. Terça-feira o dia estarár lindo. Um arco-iris preto-branco-encarnado vai aparecer no céu da cidade. A noite, o céu ficará limpo, brilhando e a lua vem nos ver jogar.

E amanhã mesmo, já vou comprar meus ingressos.

Terça-feira, não tem desculpa. Todos ao Arruda. Foi assim que o frequentador assíduo desse Blog, o Coral, escreveu nos comentários do texto de Samarone.

Estou contigo Coral.

“Nada” pode justificar uma ausência do verdadeiro torcedor do Santa Cruz neste jogo contra o CRB.

Nesta terça, todos as ruas, avenidas, becos e ladeiras nos levarão para Avenida Beberibe.